sábado, 23 de fevereiro de 2013

O CASAMENTO DO TIL COM A CEDILHA

Desde que o mundo é mundo, as coisas se unem. O que seria das árvores sem as folhas?
E do gramado sem a beleza das flores? Imaginaram a brisa de primavera não roçar nossa face numa tarde quente?

É o toque. E podemos dizer inúmeros deles, vejam bem: nossa língua num sorvete de creme... A ponta do nosso dedo no bolo de chocolate, e depois em nossa boca...

É o toque.

Mas longe disso tudo, no mundo das letras, o toque também existia. As letras viviam bem juntinhas para formar palavras. Cansaram de ficar lado a lado e resolveram dar as mãos. Feito crianças quando atravessam as ruas.
 
Assim, uma à outra, eram mais fortes e trabalhavam juntas para informar as pessoas, fazer outras chorarem e outras mais cair de tanto rir.

E numa dessas uniões, várias letras já mais separaram as mãos. É o caso do ch, que se conheceram na palavra charme e nunca mais se desgrudaram. Há também as almas gêmeas, o ss, que se conheceram no berçário, na palavra sossego, e até hoje vivem em perfeita harmonia.
 
Temos também os casais, lh, nh, rr e qu, que se apaixonaram em maravilha, carinho, sorriso e querida para nunca mais se desgrudar.

Há, porém, um casal que ainda não está unido, embora deseje muito isso. Fora na palavra fascinação que se conheceram e, desde então, cada vez que se encontram, cada qual passa a fixar o olhar um no outro, perdidamente apaixonados.

Foram o A e o C que perceberam o flerte e acompanham cada passa dos dois. A notícia foi se espalhando até que um dia todas as letras, casadas ou não, resolveram desmascará-los.

Num dos vários encontros de folga, no período que pessoa alguma estava lendo, as letras fizeram a pergunta crucial: “O que vocês estão pretendendo com este namoro?”.

Pego de surpresa, o casal resolveu abrir o jogo e não esconder o que já estava descoberto.

O alvoroço foi geral, afinal, como podiam traços tão distintos contrair matrimônio assim?
Ora, nem letras eram, e, só para começar, a Cedilha vivia grudada no C!

Um abuso aqueles dois! No entanto mal podiam reparar que o coração ficaria mais romântico com o casamento. E o que falar da emoção! E a música seria mais melodiosa, se a canção pudesse abençoar a união! E que dor não seria suportável com a nossa união em injeção!

E só haveria sim na negação!

Com a magia do amor no ar, as letras, casadas ou não, não poderiam deixar de se contagiar. Porém, eram realistas e, ainda que, agora, torcessem pelo casamento do par, não poderiam ser elas quem os uniria.

Sabiam que o amor dos dois era maior que o impossível, mas o toque dos dois talvez não. O que realmente importava era que não precisavam de pessoa alguma, pois, apesar de separados, quem garante que não estavam juntos?
 
Juntos nos momentos mais difíceis e nas horas mais maravilhosas. Não cabe a nós decidirmos pela felicidade dos dois.

Escritos juntos ou não, o que vale é a proximidade dos próprios sentimentos.

Por que iríamos nos preocupar com eles? Eles nem se importam com a nossa preocupação. A Cedilha e o Til unem-se cada vez que fechamos um livro ou um caderno. Não precisam de ninguém para juntá-los. Apenas um do outro.

Como posso garantir isso? Ora, só quem ama sabe dessas coisas.

 

4 comentários:

  1. Pura emoção esse texto, assim como o amor! :)

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  2. Que talento,eu procurei por esse conto ,porque o mesmo ganhou um concurso literário na categoria “lusofono”

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    1. Paula, boa tarde. Não fui eu que ganhei, foi o livro do Guilherme, uma enorme coincidência de nomes. Apesar de terem o mesmo título, são teores bem diferentes. Mas agradeço pelos elogios.

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