segunda-feira, 14 de janeiro de 2013

NE ME QUITTE PAS

Já diria um provérbio turco que somente Deus pode se dar o direito à solidão, endossaria Tom Jobim que é impossível ser feliz sozinho. Se provérbios e versos famosos são clichês permitidos, talvez deva haver um fundo de verdade.

Escolher quem estará nesse nicho tão complexo é uma tarefa tão impossível que somente o coração acaba decidindo.

E como a coincidência é o destino que perdeu a agenda, muitas vezes a nomeamos associando a um fato bem-sucedido, a uma surpresa bem-vinda. E já que somente os vitoriosos contam a história, cabe aqui um relato de dois campeões.

França, século XXI, brasileira, estudante de arte matriculada num curso de arte medieval. Se um nome cairia bem, que seja Claire. Pontual nos traços e um desastre nos ponteiros, sobe correndo os degraus de mármore. Abre a porta da sala e vê Theodore, brasileiro radicado em Paris já há 6 anos.

Eles se olham. Ele gagueja, ela sorri tímida e cora. Ambos soltam um bom-dia tenso. Ela senta e ele retoma. Ao fim do primeiro dia, ela retarda a saída esperando um adeus mais dedicado. É o que acontece, corados se despedem, desejando que ambos voltem no dia seguinte.

E por quase um mês, três vezes por semana, limitaram-se a um bom-dia bem mais direto, seguro. Ele conseguia gaguejar menos quando a olhava durante a aula, ela conseguia os melhores traços do seu rosto enquanto falava.

O fim daquele módulo pontuou somente a última frase. Ambos se esperaram. Todos saíram. Ela se aproximou com um envelope grande com mais que duas palavras: “Tudo o que aprendi com você!” – era um retrato lindo dele.

Ele sorriu, abriu a gaveta da mesa, e tirou um CD da banda que estampou várias camisetas dela durante o curso e disse: “Um pouco que aprendi de você”.

Trocaram endereços e riram juntos quando perceberam que apenas 1km os separavam um do outro. E deram murros ao quase azar de uma vida inteira, sem querer, de nunca se encontrarem.

Naquela noite, ele procurou por ela, que há dois minutos já estava pronta para recebê-lo, mesmo sem terem combinado nada. Ela desceu, Theodore ofereceu uma rosa.

E quando ela explicava como amava Piaf, ele agradeceu aos céus por Claire
não ter se matriculado no curso da sala ao lado.

E quando ele disse que Piaf deveria ser ouvida com champanhe, ela agradeceu por ter aberto a porta do curso errado.  

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