sábado, 26 de janeiro de 2013

DADINHOS, MEUS AMORES!

Quantos pecados uma pessoa é capaz de cometer ao longo de uma vida? E quantos desses pecados seriam, digamos, perdoáveis? Para defender a honra, a vida, um nome. E para defender uma vontade?

Fato é que a mãe e o menino estavam numa quitanda. Os anos 70 ainda espalhavam várias em qualquer bairro de São Paulo. Quem teve o prazer de entrar numa, sabe que o aroma dela só perde para a de uma livraria.

A mescla de frutas e de doces no local traz cores tapo intensas ao nariz que são de embriagar qualquer mortal, qualquer ser glutão.

Enquanto a mãe revirava melões e tomates, o moleque não tirava os olhos dos Dadinhos daquele vidro. E se pudéssemos nos aproximar deles, ouviríamos: “me come, me come, me come”.

Audacioso, o menino mal podia falar engasgando com a própria saliva. Assim que conseguiu engolir, fora certeiro: “compra pra mim, mãe?”.

O horário antes do almoço e as negativas a esmo da mulher disseram não ao traquinas, que deveria não merecer tamanha recompensa.

Ainda assim, ele não tirava os olhos do vidro. Fora arrastado para fora quase tropeçando na própria vontade e deixando mais do que saliva pelo caminho, deixava um desejo imensurável pelo doce.

Durante o almoço e o Globo Cor Especial, não conseguia tirar do pensamento aqueles cubos prateados. Tudo tinha gosto de Dadinho. O arroz, o bife e até o ar, tudo cheirava a amendoim e gordura vegetal.

Vício e vontade insuportáveis! E para defender tudo em que ele acreditava, valia pedir dinheiro à mãe e lutar por tudo! Tomou outro não, como um tapa doído, inesquecível.

Mas os olhos vidrados pediam mais e mais! E quando o corpo pede a droga, o ser humano não responde mais por si. Suando, delirando, ele andou três quarteirões, cambaleante, e rumou firme à quitanda.

Entrou no local, examinou em volta, ratificou que nada o deteria, seguiu até o pote prateado. Viu que o dono não olhava, enfiou a pequena mão e conseguiu pegar uns 4.

Enquanto resgatava o tesouro, o dono viu a cena. Enfureceu-se e antes de falar, o moleque saiu correndo. Poderia se livrar do flagrante. Mas correu como nunca e, na primeira esquina, ofegante, quase desmaiando de cansaço, abriu os 4 e, de uma vez, socou-os na boca.

O gosto de roubar para matar uma vontade deixou-os mais saborosos ainda. Foram os melhores Dadinhos da minha vida.

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