quinta-feira, 4 de abril de 2013

COISAS QUE NÃO ACONTECEM


Não havia mais pessoa alguma no restaurante, a não ser aquele homem, com o mesmo copo de uísque de duas horas atrás, o jornal aberto na seção de esportes e uma porção intocada de amendoins.

Não se mexia, apenas respirava, apoiava-se na mesa e deixava que as horas fossem a única companhia da noite. Todas as mesas já estavam desfeitas, era 1h30 da manhã e o cliente não esboçava qualquer reação. Poderia virar o copo de uma vez e, em quatro punhados, acabaria com o amendoim, mas nem isso.

Um garçom se aproximou e tentou um contato visual. Nada. O caixa estava praticamente fechado. Três dos cincos tendentes já tinham se trocado e se despediam em voz alta, um incentivo a outros mais saírem. Nada.

Com a aprovação do gerente, os dois restantes foram se trocar, talvez o clima noir e silencioso fosse a última tentativa antes de o convite ser feito. Dois mais saíam. Nada. A menina do caixa ligava para o marido e, em alto e bom som, disse que o expediente tinha se encerrado.

Não se escutou o que o marido disse, assim como nada se ouviu do cliente, que continuava em silêncio, com os cotovelos sobre a mesa, o copo de uísque intacto e os amendoins murchando. Quinze minutos depois, a buzina soou, a mulher saiu, deixando apenas o cliente e o gerente por lá.

Sentiu que a noite ainda seria longa. Pegou o celular, mandou um sms e mandaria o cliente embora.

Aproximou-se do rapaz, sentou-se e sugeriu uma conversa. O “tudo bem?” não surtiu efeito, muito menos um “posso ajudar?”. Nada. Ele continuava imóvel. Resolveu ir direto.

- Senhor, temos de fechar, porque...

O som do sms tocou no mesmo instante que o cliente sacou do revólver e se matou. O gerente deu um salto para trás e não leu a mensagem de volta e não soube que o marido da amante talvez estivesse naquele bar. Mostrar a própria fraqueza a quem lhe trouxe desgraça...

Coincidência demais, isso não acontece... 

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