segunda-feira, 18 de março de 2013

QUEM TIVER OUVIDOS QUE OUÇA

E quando tudo vai mal, quando tudo pode ruir, não importa a crença que se tenha, não importa a reza que se faça, tudo se torna válido.

Cresci com uma mãe extremamente católica, daquelas que todos os fins de semana, senão aos domingos, aos sábados, está na missa. Minha mãe com certeza estaria apta a substituir o padre.

Fato é que, numa época não muito boa ao meu irmão mais velho, minha tia, católica ao extremo, aos moldes italianos da minha avó, havia conseguido uma moça que incorporava um espírito de luz, em ajuda ao meu primo.

E aqui caíram por terra oferendas, cânticos, hóstias e entrou uma mesa branca linda. Às quartas-feiras, meu pai e o Marcelo iam até São Bernardo do Campo para que a “Vó” pudesse amansar os caminhos do metaleiro e abrir-lhe as portas.

Confesso que não me lembro se deu certo, mas se eu dissesse que não, estaria mentindo. As lembranças de sucesso seriam mais claras que o inverso.

Quando acabei o colegial, em 1990 (ops, ensino médio), meu gêmeo já tinha estagiado e já estava num terceiro emprego. E eu, pela escolha da época, queria ser publicitário, tinha um caminho mais estreito para passar.

Tornei-me um mestre em preencher fichas, fazer entrevistas e esperar que o telefone tocasse. Desde distribuidora de filmes pornôs, vendedor de planos de saúde ou ficar trancado num banheiro feminino – isso um dia abordarei mais pra frente – tentei de tudo.

E ratifico, quando tudo vai mal, quando tudo pode ruir, não importa a crença que se tenha, não importa a reza que se faça, tudo se torna válido. A Vó entraria em meu caminho. Aos 18 anos, fomos eu, meu pai e o Marcelo ,numa quarta-feira, pegar os conselhos de irmãos mais evoluídos.

Dando uma cor mais intensa ao caso, sou pisciano, creio em tudo e juro de pé junto que vi o Papai Noel no último dezembro. Daí, minha apreensão e minha ignorância sobre o assunto acabaram me trazendo uma paúra do inferno.

Ao chegar, me deparei com o recém-falecido Freddie Mercury, sim, era ele, meu irmão concordaria ao ler isso aqui. Tensão. Imaginei-me naquelas cenas da Igreja Universal, em que havia possessão etc. Ignorância. 

Aliás, devo ressaltar que, durante minhas madrugadas de insônia e vagabundagem, assisti a um programa pela Record, e o pastor dizia”você, que está desempregado, pegue sua carteira agora, levante-a aos céus e berre: SENHOR, TRAGA-ME UM TRABALHO!”

Tudo bem que peguei a carteira, mas não berraria por causa do horário e do constrangimento. Enfim, tensão. A sessão começaria e todos aceitaram fechar os olhos, mas eu não. Concentração nada. “Vou ficar de olhos abertos aqui, se algum espírito aparecer, eu corro”, pensei.

Em segundos, a moça bateu na mesa e todos da mesa iam falando “Bênção, Vó” – e aquela voz rouca repetindo “Deus te abençoe”.

Silêncio. Travei, mas eu vi aquela moça antes, ouvi a voz dela antes e não era a mesma.

Enfim, naquele dia, não pude me consultar com a Vó, mas fui a um tipo de assistente dela. Entrei, com um cagaço monstro, na salinha, sentei-me. O rapaz sorriu, olhou para mim e disse duas coisas que nunca mais me esquecerei:

- Fio vai trabalhar com escrita!

Profissionalmente, tenho 6 livros didáticos publicados no mercado.

- Fio gosta desse, né? – com a mão perto da boca, imitando o ato de comer.

Pela minha silhueta da época, a segunda foi óbvia, mas pela primeira, somente as luzes de algum lugar especial endossariam minhas linhas aqui... E agora também se tornou óbvia.

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