domingo, 24 de março de 2013

DEUS, MARGOT E NICHOLAS

Amor. Jamais deveria tê-lo criado. Em mãos erradas se torna fogo. E mal usado então, trovões e tempestades. E eis esta luz, que o homem a chama de alma gêmea. E se o homem é tão carente de luz e teme perdê-la, dei a ele várias delas. Tomei o cuidado de dar o suficiente a cada um deles como precaução e paz na missão do homem aqui na Terra.

Com amor, ele segue em paz consigo e com os outros. Com luz ele vê e  enxerga. Com luz, a escuridão perde, a mente do homem norteia-se e o  equilíbrio lhe é atributo principal. Sem ela o que exaspera é o desespero, a dor e o medo de seguir. O amor vira saudade, a dor usurpa a perspectiva e a esperança não passa de meras lembranças.          

As chagas não se fecham e batizam-lhe com o que de pior a vida traz, a realidade.  E como a realidade nem sempre é iluminada, coube a segunda pessoa ser tão eterna quanto o sol, quanto o calor e o brilho que possui. Uma troca de luzes, uma troca de energia. Faça-se a alma gêmea, e elas estão prontas. Cada qual como vela, a queimar juntas, a iluminar juntas o caminho e a vida de cada uma delas.

Expostas ao vento, o calor protege uma, acolhe outra. Mas, às vezes, o vento ganha, e a luz torna-se única. O fogo dança um monólogo de uma canção triste, em uníssono berra e clama pela luz que se apagou, pelo frio que está sentindo. Margot se foi. Resta-me Nicholas, que de resto se encontra o homem após as cinzas da sua mulher. Cacos do pó que se lhe fez na alma e no coração.

Às vezes as peças jogam sozinhas, às vezes, não. O homem. O amor, a vida. Problemas. Desperdício de tanto amar, não deve nem pode ficar a esmo, bailando num peito chagado. Não. Amor assim prossegue, é eterno. O amor é eterno, está para a vida como os dedos para as mãos.

Mas Nicholas ainda tem a vida pela frente, ainda há muita escuridão a percorrer. E onde está a luz que lhe abria a vida e lhe aquecia as veias? Margot se foi, levou consigo parte dele e deixou com ele parte dela. Cortou-se a ramificação que os prendia por aqui, livrou-se o temor que a esperava em qualquer outra parte. Prisão e liberdade. Amor e dor. Luz e trevas. Há de se ter cuidado no trato com as almas assim, vulneráveis, frágeis, tão humanas como o erro de se deixar conduzir. Fortes os que conduzem, piegas os que ouvem?

Não, piegas os que conduzem sem deixar-se ouvir. Há que se ouvir para conduzir, há que conduzir  juntos, ouvindo juntos, falando juntos, há que se ter comandante e gardingo, mas há que se ser um só. Mas, a vida urge, os dias correm, e o tempo não espera, comanda e não ouve, tem luz própria e sabe ouvir a si mesmo, bem diferente do homem, bem diferente de Nicholas. Uma única vida, partida ao meio, jogado ao vácuo da solidão, às trevas do medo.

Sem luz, sem Margot, nada. É noite, e toda noite sempre nos resta a perspectiva de um novo dia, com sol ou sem, sabe-se que a luz virá, forte ou fraca, mas as trevas cederão espaço ao brilho de um amanhã. É noite. E, mesmo assim, veem-se pequenos brilhos a pousar sobre nossos corpos, nossas mentes, e o homem torce que pelo menos uma daquelas estrelas esteja a olhar para ele, que uma daqueles bilhões de estrelas seja parte dele.

Aos privilegiados que trouxeram uma  delas para baixo, a vida, a paz e o amor como recompensa. Aos que sonham trazer uma delas para perto de si, a esperança de dias melhores, sem medo nem trevas, e isso não lhes tardará. E aos que perderam para o céu a estrela que cá tinham, há a conversão do amor em dor. Entretanto, há sempre a esperança do amanhã e, se as estrelas podem cair do céu, voltar a viver pode ser uma experiência interessante.

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