sábado, 25 de maio de 2013

CAQUI, AQUI NÃO!

Quando a birra com algo ou alguém aparece, não se carece de explicação ou causa. Acontece  e pronto. Assim como lados bons ocorrem, os ruins também aparecem de modo inesperado, imprevisível e definitivos.

Qualquer ser deste mundo pode relatar casos em que uma empatia boa ou péssima se fez presente. Horas no divã, horas no bar, horas no trânsito, nada seria suficiente ou eficiente para que tudo se resolva da maneira mais lógica possível.

E eis a minha luta contra o caqui. Sim. O caqui. 

Assim como muitas coisas nessa vida me aprazem esse troço de cor de abóbora (aliás, eu a odeio também, um dia minha mãe me colocou uma colher de doce de abóbora à força na boca, porque eu não queria experimentar, tive de cuspir em cima da mesa e devo ter tomado uma surra por isso) me traz mais do que arrepios, me dá a sensação de asco misturado ao cárcere.

E por quê? A briga nem era comigo, foi com meu irmão. Sim. Meu gêmeo, política e irritantemente correto, sempre levava frutas de lanche. Eu também, mas minha maçã sempre acabava no lixo - e espero que minha mãe não leia isso. 

Certa tarde, encontrei com meu irmão no recreio - sempre estudávamos em salas separadas - e ele me disse que ficara sem lanche naquele dia, porque o maldito caqui estourou na mala. E minha curiosidade acabou me afastando dele. Quando olhei os cadernos e livros do meu irmão com aquela gosma nojenta, pensei que fosse vomitar. Mas sumi a tempo.

Anos se passaram e minha aversão a ele, não. Já adulto e lecionando, numa manhã, numa sala com uns 100 alunos de cursinho, eu me deparo com uma cena inesquecível: um aluno com um caqui. Daí pergunto por que, cazzo, alguém levaria um caqui para ser comido no meio da sala de aula? E por que na minha aula?

E não era um aluno qualquer, era daqueles que questionavam tudo. Em determinado momento da aula, ele, com um caqui na mão, já sido abocanhado, teimou em perguntar algo complexo sobre análise sintática. Confesso que nos primeiros segundos eu ouvi a pergunta., mas depois...

Sim, aquela fruta nojenta começou a derreter, e pior, aquela gosma asquerosa escorria pela mão, passava o punho e alcançava o antebraço. Eu não ouvia mais nada, eu não via mais nada, apenas aquele caminho abóbora, aqueles afluentes do inferno a correrem e possuírem aquele corpo.

Quando ele acabou de perguntar - percebi isso, porque o silêncio me acordou -  e não sei por quanto tempo eu fiquei quieto - talvez os alunos achassem que a pergunta fosse complexa demais e exigia uma resposta mais bem elaborada. E não. Talvez tenha sido a natureza, talvez tenha sido a lembrança daquela tarde dos anos 80, a única coisa que fiz foi dizer:

- Enquanto você não sair e jogar esse troço fora e se limpar, eu não vou sanar sua dúvida...

Não foi o tom, nem minha intenção, a sala veio abaixo, e não fiz de propósito, fiz o que qualquer ser ante a sobrevivência faria: lutei. O aluno sorriu, encarou de uma forma mais leve, saiu e voltou. Sentou-se, sorriu e voltou a perguntar. Só então consegui ouvir, naturalmente, a pergunta dele.

Não sei qual seria minha reação, se ele teimasse em morder o caqui. E se ele teimasse em se lamber? E se ele teimasse em lamber os cadernos e livros do meu irmão?!

2 comentários:

  1. rs..eu adoro caqui e logo ali, próximo do Anglo tem uma feira,e em algumas vezes no intervalo fui até la,e pensei em comprar caqui mas não teria como leva-lo c cuidado p a sala e depois p casa..
    Ah e vale lembrar que a verdade é que seu aluno que era porco porque eu como sem fazer nenhuma sujeira!kkkk

    ResponderExcluir
  2. Ainda bem, Angela, porque essa nojeira tem me acompanhado, como um kARMA do cão, pela vida toda!

    ResponderExcluir