segunda-feira, 24 de junho de 2013

O SORTUDO

Essa não é uma dessas histórias que acontecem sempre. Porém é uma daquelas que sempre devem ser contadas. O protagonista em questão, cujo nome não nos vem ao caso, sempre repetiu aos quatro cantos que nasceu sem sorte.

O mais velho de seis irmãos, nunca liderou nada pela natureza. Não foi dele a primeira nota dez, não foi dele o primeiro emprego, o primeiro casamento ou o primeiro neto. Dizia quase num mantra que a primeira vez nunca traria seu nome.

Abrindo um espaço aqui, não teve uma vida medíocre. Levou tudo de modo normal. Casou-se, teve um bom emprego, até conheceu a Argentina, formou dois filhos e, mesmo sem excessos, passou vontades como a maioria das pessoas.

Entretanto o velho hábito de urrar não ter sorte esteve sempre em seu encalço. Nunca ganhou na loteria, apesar dos jogos semanais. Nunca achou uma note de dinheiro na rua, apesar de viver andando com a cabeça de olho no chão.

E foi numa dessas caminhadas que não reparou que um carro parou atrás dele.

Não reparou que três homens saíram do carro e correram até, só reparou que tinha sido abordado de modo abrupto pelo trio quando se viu dentro de um porta-malas de um carro em movimento.

O que pensar? O que fazer? Rezar? Chorar? Como entender? Tantas perguntas para se responder e ele apenas endossou com pena de si mesmo que a sorte dessa vez, literalmente, havia pregado uma peça nele. Aos 65 anos, seria morto, porque, se fosse um sequestro, dinheiro não havia.

Quieto ficou aceitando o azar como companheiro fiel. Sentiu as curvas aparecerem e sumindo várias vezes. A velocidade do carro e dos pensamentos se confundia. Os trancos que dava com o descuidado balançar era um empecilho e tanto para ele.

Tentou rezar, mas não conseguiu juntar a lógica de uma oração sequer. Repensou sua vida e julgou-se injustiçado por tudo aquilo. Quem eram? O que queriam? Por que ele?

Enfim o carro parou. Preferiu o silêncio e decidiu aceitar tudo sem nada, apenas culpou mais uma vez a falta de sorte. Tiraram-no de lá e o levaram para dentro. Deparou-se com um olhar arregalado e inconformado, que virou ao trio e berrou:

- Não é ele! Pegaram o cara errado! Não é ele! Leva o cara daqui!

E voltou para dentro do porta-malas e, dessa vez mais rápido, deixaram-no numa avenida distante. Quando reuniu a lógica, viu o carro se afastar, olhou aos lados e viu o pessoal do bar olhando-o de modo absorto e incrédulo. Ele ficou mudo. Um dos rapazes, o mais velho chegou até ele, ofereceu ajuda e escutou:

- Como chego no centro? – perguntou.

- São duas conduções até lá... – respondeu sem entender nada.

Ele meneou a cabeça aos lados, decididamente e mais uma vez disse a si mesmo não ter sorte. Àquela hora, o trânsito de volta deveria estar um inferno...

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