terça-feira, 29 de outubro de 2013

O VOLÚVEL

Tinha na segunda-feira aquele seminário importantíssimo para apresentar ao chefe. Promoção iminente. Não dormia direito há dias, mal comia, chegava às 6h e saía às 22h, preparando slides e tabelas e números.

Pela secretária, soube que era o preferido, e que se na apresentação fosse tudo bem, 75% a mais no salário e um cargo de confiança há muito merecido. Na quinta-feira, sentiu calafrios, um arrepio nervoso e uma irritação na garganta.

Na sexta pela manhã, estava fanho, a voz quase não saía. Comprou um analgésico e tocou a cara em vitaminas C. Não tinha como ficar doente, não agora. O chefe olhou para o rosto dele:

- A apresentação está pronta?

Ele assentiu com a cabeça.

- Então suma daqui, quero você ótimo para segunda-feira!

 Uma bênção, eram 11h da manhã, e ele estava debaixo das cobertas. A esposa preparou-lhe uma sopa quente de lentilhas, que foi devorada com a promessa de o marido largar o notebook.

A febre cedeu. Mas a garganta estava estragada, o nariz entupido. Sentia-se melhor no sábado. Ainda assim não estava 100%. Domingo pela manhã, sim, era outro, decidiu caminhar e foi na volta que teve a reviravolta.

Após o almoço, olhos, testa e nariz queimavam: sinusite. A nuca doendo, a cabeça estourando. E a ansiedade do rapaz nas alturas. Eram 15h, e havia pouco tempo à apresentação.

A esposa seguiu desesperada à farmácia, trouxe dois remédios, que foram devorados. Para a dor na nuca, tomou mais um e mais duas doses de um outro para a dor de cabeça.

4 horas depois, era outro. O mundo conspirava para a sua promoção. Teve medo de se sentir bem naquele momento apenas e de, dali 12 horas, tudo voltar. Não podia transpor o horário dos medicamentos.

Achou que aquilo pudesse ser uma crise de ansiedade. Sim. Só podia ser, muita pressão, a promoção que tanto desejava. Sabia que a esposa tomava uns tarjas pretas e foi revirar o armário do banheiro.

Pegou logo uns dois e os meteu pra baixo. Tudo daria certo. Eram 8h30, e nada do cara. 9h, 10h. E a reunião passou. Lázaro só levantou às 11h30. Com o pior gosto do fracasso na boca, mas com a melhor noite de sono da sua vida.

Ele pediu demissão no dia seguinte, porque desde sua entrada nessa empresa, nunca havia tido uma noite de sono tão maravilhosa como aquela. O rapaz se arrependeria dias depois, quando o efeito do Lexotan sumira. Mas o chefe não responde às suas ligações.

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