sábado, 15 de dezembro de 2012

AS ESPECIARIAS DE TIO CARMELO

Tio Carmelo tinha um sonho, voltar para Tramútula, na Itália e mandar o coentro de lá, segundo ele, o melhor do mundo.

O tramutulês chegou nos anos 60 por aqui e fez a América com suas especiarias, queijos, frios, azeitonas e pães. Não casou, trouxe as seis irmãs para cá e cuidou delas como filhas.

Tinha 16 sobrinhos e 5 sobrinhos netos. Palestrino, dedicou-se aos clientes e às arquibancadas do Parque Antártica. Teve uma vida honesta e sem muitos sobressaltos.

Gabava-se de ser o primeiro a querer ser cremado na família e a não temer a morte. E digamos que foi um breve resumo da vida desse homem, que passou os dias juntando dinheiro para voltar ao país, que tanto ama.

E depois de quase 50 anos, ele conseguia. Aos 79 anos, Carmelo conseguia dinheiro suficiente para ir para Tramútula e por lá ficar e finalmente todos conheceriam o coentro italiano.

Dizia o tio que até a cor era diferente, porque quando se prefere algo, quando se ama algo, tudo é diferente, mesmo sendo igual.

E a italianada se reuniu em Cumbica e fez a zarzuela chorosa, exagerada. Digna de recepção de banda de rock. E o aceno alegre de Carmelo selou sua missão no Brasil e o colocou de volta aos temperos da velha bota.

Semanas se passaram, e uma caixa com seis frascos chegavam da Europa. Quem os recebeu foi a caçula, de 12 anos, que urrou dizendo que os “coentro italiano” tinham chegado. E que o pirão daquele domingo seria à base de Tramútula.

A parentada se reuniu para comer um prato típico brasileiro com o toque mágico de Carmelo e suas especiarias exóticas.

Muita música, muita festa. E aquela anchova com o pirão ficou única, realmente o tio fora certeiro, aquele sabor era eterno.

Havia apenas um detalhe naquele evento: crer que a carta que chegara junto aos frascos com a palavra-chave “cremazione” poderia estragar o almoço era fato.

Então que a notícia chegue depois da digestão.

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