domingo, 18 de novembro de 2012

O DIABO LOURO E O SECADOR ARNO

Quando uma história envolve duas pessoas, dizem que existem três versões para ela, uma de cada indivíduo e a real. Porém, em certas ocasiões, nada comprova nem uma segunda versão, há apenas a verdadeira.
 
Mas antes disso, tenho dois irmãos, meu gêmeo, Luciano, aquele irmão odiado, porque nunca levava bronca, sempre predisposto a ajudar os pais – o que me demandava tarefas infinitas – e o mais velho. O Marcelo, sempre ele, esteve envolvido em quase todas as traquinagens de minha infância.

Em 1982, eu e meus 9 anos estávamos no banho, com certeza tentando cantar algo parecido a THE NUMBER OF THE BEAST. Todo ensaboado e com shampoo Johnson's até onde se pode imaginar. Não pude crer que as invocações ao demônio pudessem ser tão precisas e inconsequentes.

Descrever o banheiro é algo um pouco mais complicado. Azulejos de bolinha azul, vaso sanitário e lavatório vinho. Pois é, o demônio já habitava o local, a invocação ficou mais fácil. O box era uma espécie de porta que corria, feita daquele plástico mais resistente e turvo, o que impedia a visão interna. E aqui reside o mal.

Sabe-se lá por qual motivo, meu irmão mais velho quis me dar um susto. Bastava abrir a porta e pronto. Mas não, nunca saberemos o que se passou na cabeça de uma criança de 13 anos, que optou pelo improvável.

Enquanto eu estava na segunda estrofe em aramaico do Iron, pude perceber duas mãos aparecendo no topo do box. Lentamente, a cabeleira loura do Marcelo foi surgindo. Ou seja, o susto virou curiosidade mútua. E eu pensando que cazzo ele queria com aquilo tudo.

Lembro de o sorriso dele ficar lá por cima por uns 5 segundos. E, de repente, ele sumiu, junto a um estrondo gigantesco. O pimpão apoiou o pé no lavatório, que cedeu bruscamente trazendo tudo para baixo, e um deles foi o Marcelo.

O perigo de ser retalhado foi iminente. Graças ao bom Deus não aconteceu, mas a retaliação da minha mãe seria inevitável. Com a queda, o cano ficou aberto, e uma enxurrada avassaladora, um jato potente de água saía do banheiro, batia na parede do corredor e descia pelas escadas.

Luciano, o irmão santo, ao ver aquilo começou a berrar: "Cataratas! Cataratas!". 

Não consegui ouvir quais imprecações minha mãe soltou. Só sei que, diante do fato, fiquei sem água, todo ensaboado, e com o lamento do diabo loiro.

Meu pai, que tentava abocanhar uma laranja, só teve tempo de fechar o registro. A água que desceu pela escada, e não foi pouca, parecia um açude furioso, molhou todos os móveis da recém-comprada mesa e suas cadeiras de tapeçaria estampadas.

Lembro que meu irmão passou horas secando os móveis como punição, com o secador Arno, rosa. Lembro que a laranja que meu pai tentou comer ficou para meu gêmeo e a mim, coube encerrar o show no meio da primeira música.

Sobre as 3 versões? A minha: nascia ali a primeira manifestação da idolatria do meu irmão a mim. A do meu irmão Marcelo: quis soltar uma cusparada na cabeça do caçula. E a real: foi a melhor maneira de nos livrarmos daquele vinho horrível, o banheiro foi reformado meses depois.  

 

 

8 comentários:

  1. Coitada da sua mãe! Três filhos, cada um com 3 versões, a própria, a do outro e a real. Medo! Ri sozinha com as "Cataratas! Cataratas!" e com você todo ensaboado e sem água. Excelente, Dri!

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    1. Lu, ensaboado, sem água e com o show interrompido! Obrigado pelos elogios!

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    2. Uma correção pertinente, o ano era 1981. Não contarei em detalhes no meu livro, mas esse fato está lá, com a minha versão é obvio.

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    3. Nada como tomar o depoimento do fã, pois até o ano preciso ele sabe! - rs

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  2. Ai meu Deus!!! Sua mãe é uma santa!!!!rsrsrsrs

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    1. Minha mãe uma santa, Pietra? Santo sou eu, qu conseguia apanhar dela sem ter feito coisa alguma! - rs

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    2. E o pior é que o banheiro da minha infância não era muito diferente... Por falta das benditas florzinhas mos azulejos, monha mãe os adesivou com contact!!!!!!!

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    3. Realmente, deve ter ficado uma belezura! - rs

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