segunda-feira, 17 de janeiro de 2022

O PACIFICADOR MÍOPE

Histórias sobre óculos sempre são inusitadas, mas a que veremos é mais do que isso, é um brinde à paz.


O ano é 1992. Tínhamos um grupo seleto para ir aos jogos do Palmeiras. Não me lembro se naquele domingo havia mais alguém, mas fato é que eu, Marcelo Paciello, Luciano Paciello e Anderson Menon, vulgo Xu, estávamos na estação de metrô naquela tarde.

Pela insensibilidade da Federação Paulista, Palmeiras e São Paulo jogariam no mesmo dia, no mesmo horário. E fomos os 4 ao jogo já nos moldes costumeiros, anônimos.

Ao chegarmos à plataforma, percebemos uma movimentação grande de palmeirenses. Percebemos também que, de longe havia são-paulinos se aproximando.  O embate seria iminente.

O deslocamento começou a acontecer. Um grupo se juntou e começou a xingar. Em vez de o outro se afastar, não, preferiram retribuir a recepção. E nós torcendo para que o trem chegasse o quanto antes.

Nervos acalorados, tensão acesa, trem chegando.

E chegou antes que os dois grupos se atracassem. Rapidamente, nós 4 entramos e deixamos muitos na plataforma. A porta fechou, mas o trem não saía, e a briga começou, a poucos metros de todos, que se amontoavam nas janelas com olhares tensos, mas curiosos.

Como a plateia era grande, o Marcelo não conseguiu um bom lugar para ver. Não teve dúvida, forçou a porta do trem com as mãos, abrindo-a, enfiou o rosto entre as borrachas e bum! Um rojão estourou por lá. Todos se assustaram, inclusive o meu mais velho, que, num impulso, começou a berrar:

- Meus óculos!!! Meus óculos!!! 

De pronto, o Xu, que estava perto da porta, deu murro no compartimento de plástico e acionou o botão de alarme. Imediatamente a porta se abriu e o escandaloso do Marcelo saiu berrando:

- Meus óculos!!! Meus óculos!!!

E o bizarro aconteceu. Quando você menos espera, o milagre se faz. Aquele alemão, vermelho de berrar, com os olhos azuis arregalados berrando conseguiu o impossível. 

A briga parou.

Todos se sensibilizaram com os urros do meu irmão. Deu até para ver um palmeirense enforcando um são-paulino com a direita e socando o rosto dele com a esquerda parar o ato e perguntar se o Marcelo estava bem. 

Até mesmo o surrado se preocupou. A briga tinha cedido. Marcelo Paciello, o pacificador da tarde. O trem partiu. Funcionários do metrô chegaram. Interditaram a estação e pescaram a armação dos trilhos. Uma lente sumiu, mas a outra estava lá. 

Fomos ao jogo e tivemos de ouvir o caolho do meu irmão reclamar que não conseguia assistir direito ao jogo por conta de uma lente só. 

Não sabemos se a briga recomeçou, só tivemos a certeza de que Marcelo Paciello igualou-se a Pelé, também parando uma guerra. 

E, naquela tarde, o palestrino endossou e fez jus ao ditado popular: quem tem um olho é rei.

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