Fato
é que a mãe e o menino estavam numa quitanda. Os anos 70 ainda espalhavam
várias em qualquer bairro de São Paulo. Quem teve o prazer de entrar numa, sabe
que o aroma dela só perde para a de uma livraria.
A
mescla de frutas e de doces no local traz cores tapo intensas ao nariz que são
de embriagar qualquer mortal, qualquer ser glutão.
Enquanto
a mãe revirava melões e tomates, o moleque não tirava os olhos dos Dadinhos
daquele vidro. E se pudéssemos nos aproximar deles, ouviríamos: “me come, me
come, me come”.
Audacioso,
o menino mal podia falar engasgando com a própria saliva. Assim que conseguiu
engolir, fora certeiro: “compra pra mim, mãe?”.
O
horário antes do almoço e as negativas a esmo da mulher disseram não ao
traquinas, que deveria não merecer tamanha recompensa.
Ainda
assim, ele não tirava os olhos do vidro. Fora arrastado para fora quase
tropeçando na própria vontade e deixando mais do que saliva pelo caminho,
deixava um desejo imensurável pelo doce.
Durante o almoço e o Globo Cor Especial, não conseguia tirar do pensamento aqueles cubos prateados. Tudo tinha gosto de Dadinho. O arroz, o bife e até o ar, tudo cheirava a amendoim e gordura vegetal.
Vício
e vontade insuportáveis! E para defender tudo em que ele acreditava, valia
pedir dinheiro à mãe e lutar por tudo! Tomou outro não, como um tapa doído,
inesquecível.
Mas
os olhos vidrados pediam mais e mais! E quando o corpo pede a droga, o ser
humano não responde mais por si. Suando, delirando, ele andou três quarteirões,
cambaleante, e rumou firme à quitanda.
Entrou
no local, examinou em volta, ratificou que nada o deteria, seguiu até o pote
prateado. Viu que o dono não olhava, enfiou a pequena mão e conseguiu pegar uns
4.
Enquanto
resgatava o tesouro, o dono viu a cena. Enfureceu-se e antes de falar, o
moleque saiu correndo. Poderia se livrar do flagrante. Mas correu como nunca e,
na primeira esquina, ofegante, quase desmaiando de cansaço, abriu os 4 e, de
uma vez, socou-os na boca.
O
gosto de roubar para matar uma vontade deixou-os mais saborosos ainda. Foram os
melhores Dadinhos da minha vida.
Eu o perdoaria por isso. Afinal, dadinhos são irresistíveis!
ResponderExcluirÓtimo, sentenciado inocente!
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