Era
louco para aprender piano, mas meu pai me convenceu a aprender violão, assim “levaria
a música a todo lugar”. Em 1983, voltei do Mappin da praça Ramos, centro de São
Paulo, abraçado ao meu novo brinquedo. Confesso que ousei dedilhar alguma
coisa, tentei imitar meus ídolos da época e juro que iria tocar tal qual eles.
Na
escola onde estudava, às quartas-feiras à tarde, uma professora do bairro se
predispunha aos novatos. Lembro que mal almocei direito naquele dia, e olha que
para isso acontecer, o acontecimento tem de ser único. Estava pronto há horas.
Entrei
na sala e vi uma triagem, havia dois professores. O que passava os acordes e as
batidas e os que tomavam a lição do dia anterior. Meus olhos brilhavam, o
instrumento era maior do que eu, e se cada um tem sua cruz para carregar,
aquela me era uma bênção.
Esperei
ansiosamente pela minha primeira aula de violão. Minutos depois, sentei-me, ela
olhou para mim, sorriu e perguntou quanto eu queria aprender, eu respondi “bastante”,
e ela completou dizendo que seria fácil. E foi.
Não
pude crer quando meus dedos gordinhos conseguiram, no mesmo di desenhar o lá, o
ré e o mi. Ela sorriu, porque meus olhos devem ter marejado e sorrido ao mesmo
tempo. E, como todo novato, as trocas eram insuportáveis. Mudar de uma posição
à outra, nos primeiros minutos foram os degraus do inferno. Mas como teimosia é
uma qualidade essencial às conquistas, consegui.
Ganhei
um parabéns logo de cara e uma música
do Roberto Carlos, Fé. Cheguei eufórico para mostrar à minha mãe. Não peguei
nos cadernos quase naqueles dias, o violão tomou conta das tardes e noites. Difícil
não era para mim, porém aos meus irmãos e aos meus pais, aquela voz desafinada
tentando acompanhar os ruídos das notas deve ter sido complicado.
E
os dias se passaram, e as músicas e notas iam aumentando. Minha dedicação era única.
E sem falsa modéstia, meses depois, era quase um virtuose. Uma máquina de
tocar. Pegava músicas, acumulava um repertório maravilhoso. Do MPB ao rock’n’roll,
era a atração das visitas. Orgulho dos meus pais, que agradeciam que o dinheiro
era bem empregado.
Virou
costume em casa ter o violão durante horas. E sobrado, porque o meu irmão mais
velho entrou comigo nisso. Tudo era fácil, tudo era tranquilo. Um ano depois,
fui considerado o melhor aluno de lá, claro, no nível em que me encaixava.
Próximo
passo, aprender o clássico, ler partituras, entrar realmente no mundo musical.
E foi aí que as notas começaram a desafinar. Errava muito nos exercícios. Não
conseguia entender direito a dinâmica das linhas e fui percebendo que eu era um
farsante, apenas um curioso entojado e pretensioso demais para a realidade.
Cantar
para mim, até hoje, se tornou um mistério. Não sei se larguei o violão porque
me apaixonei por isso ou se busquei uma fuga para justificar meu fracasso,
minha covardia de não encarar um desafio ainda maior.
Hoje,
quando toco, e isso é raro, muitos me elogiam e eu acabo me transportando 30
anos atrás, porque o Adriano com 10 anos era fenomenal, eu me exibia igualmente
como hoje.
Acabei
cumprindo o que meu pai me pediu, levei a música a vários lugares. Porém devo
confessar que o violão não se tornou um trauma, mas ainda me chega como uma
cruz pesada demais para se carregar.
Lembro-me das festas na sua cass, regadas a mta música, como se fosse hoje. E olha que só peguei um pedaço, hein!
ResponderExcluirEste comentário foi removido pelo autor.
ResponderExcluirSim, Mi, e eram músicas boas, né?
ResponderExcluir