Perto
de um colapso, lembro que fazia inglês na época e dividia meu verbo to be com classificados dos jornais e a
programação de TV na madrugada. Talvez tenha sido aquele programa na Record,
havia um culto evangélico e o pastor berrou olhando para a câmera: “Você que
está desempregado, pegue sua carteira agora e berre aos céus, Senhor, salve
minha vida!”.
O
desespero faz isso, corri para minha carteira, levantei-a, mas não poderia
berrar, porque em minha casa na época eu era o único sem horário para levantar
diariamente. O berro não saiu, mas a fé falou bem alto.
Dias
depois, um vizinho músico me convidou para um teste numa peça infantil, seria parceiro
dele tocando violão. Cazzo, genial, além de artista, o show bizz receberia o
melhor contador de piadas da família. Lembro que numa noite, depois da aula de
inglês, o Marcelo me levou até o teste.
Fui
aceito e comecei a ensaiar as músicas. Ensaios e mais ensaios. E aquele cheiro
da coxia foi impregnando em minhas veias. Estava dentro do cenário do teatro
brasileiro. Ok, não tão dentro assim, ficávamos ao lado, acompanhando os atores
com cantorias lindinhas da peça infantil e contracenando em todos os atos.
Dois
meses depois, a peça O COLORIDO CAMINHO DO CORAÇÃO estrearia no teatro Flávio
Império, zona leste de São Paulo, para convidados, parentes e afins. Tensão. Meus
pais estavam lá, meus irmãos estavam lá, amigos estavam lá. Casa cheia.
A
entrada dos músicos se dava do fundo do teatro, tocando os violões e cantando
com os atores. Parávamos os dois em cada escada de acesso ao palco, apoiando os
instrumentos nas pernas e embalando a multidão, que nos acompanhava com palmas.
Tentei
evitar o figurino, mas nada demais. Ficávamos inteiro de preto, com um babado
laranja no pescoço e um adorno vermelho em forma de triângulos de quatro
pontas. E a maquiagem? Pó no rosto, lápis nos olhos e batom vermelho,
fato que fez meu pai indagar, ao término da peça, entre os parabéns de todos: “Essa maquiagem é necessária?”.
O
musical infantil era fantástico, cativante. Minha mãe e minha prima de 6 anos
perderam as contas de quantas vezes assistiram ao espetáculo. Foram centenas de
apresentações, em 3 teatros diferentes, durante dois anos. Dezenas de escolas
públicas fechavam passeios para nos ver, por 60 minutos, eu me sentia um Molière.
Todas
as apresentações foram mágicas. Pois as crianças nos faziam
sentir superastros - até autógrafo cheguei a dar - em cada aplauso, riso e xingamentos ao vilão. Vivi bons momentos no
palco e trouxe todos eles comigo nas minhas aulas no cursinho.
Pois
é, os tempos de “merda” foram marcantes. Confesso que muitas vezes, à noite, eu
fecho os olhos e me lembro das palmas das crianças, numa cadência deliciosa,
num coro ingênuo e sincero:
-
Começa! Começa! Começa!
Que legal, Dri!!! Adorei essa experiência...rs
ResponderExcluirBjs
É, Dri, só quem subiu ao palco pode querer subir sempre! Bjos!
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