Que seja. Quem mora numa sabe que segredos, brigas, comentários, os vizinhos da esquerda e da direita em poucos dias já faziam parte do seu dia a dia. E, como o ser humano acaba se acostumando a tudo, conviver com a intimidade alheia deixa de ser anormal e passa a ser corriqueiro, gerando até uma carência quando tudo está quieto.
Cresceram
numa casa geminada, não se sabe quanto da vida deles foram expostas, mas,
quando se é criança, não se pensa a respeito. Ou, se pensa, com certeza é
porque a exposição acaba sendo inevitável.
Havia
um banheiro nos fundos, atravessando o quintal, colado ao quartinho de bagunças.
Quis aquela tarde que o banheiro de cima estivesse ocupado. O menino teve de
correr ao dos fundos.
Concluída
a obra (ambíguo isso, né), ele e seus 12 anos se encontraram desamparados. Sim,
não havia papel higiênico por lá. Tensão. Aquela sensação de pavor. Abriu a
porta, esticou a cabeça, ninguém.
Levantar-se
e procurar ajuda era inviável, porque, se fosse para levantar e andar... Melhor
deixar a imaginação correr solta.
Rezou
para alguém aparecer. Escutava o cachorro da vizinha latir, uma conversa entre
casais e, principalmente, os convidados da casa à esquerda, bem como o cheiro
do churrasco naquela domingo. Ninguém.
Pensou
em chamar por alguém, mas ficaria evidente demais. Lembrou-se do irmão. Pegou o
celular e mandou um SMS: “Cadê você?”. “Aqui no quarto, por quê?”. “Pode vir
até o quintal?”. “Pra quê?”. “Desce, vai!”.
Em
segundos o menino aparece. Abre a porta de tela e vê o rosto do irmão, que
escancara a porta, mostra o rolo de papel higiênico, balbuciando: “Acabou o
papel”.
E
o mais velho não teve dúvidas, de lá mesmo, em alto e bom som:
-
Mãe, acabou o papel higiênico do banheiro daqui debaixo e o Juninho precisa se
limpar, onde tem?!
As
risadas dos convidados vieram antes da ajuda do irmão, que jurou que não fez de
propósito. Pior para o caçula que, por causa do papel higiênico, teve de assumir
o papel de ingrato e o de cagão da tarde.
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