Num
feriado prolongado, ele se animou. Foi até a loja de tintas do bairro. Tintas
pincéis, lixas, aguarrás, luvas. Há tempos que o velho senhor, dono do estabelecimento
não lucrava tanto numa compra só. Quase ninguém pintava tanto assim.
Eram
10h e começou o trabalho. Esticou a extensão, trouxe o porta-CD e deixou o rock’n’roll
ajudá-lo nas raspagens e nas pinceladas. Algumas pausas para beber água e comer
algo e, 7h depois, o muro estava lindo.
Não
se lembrou de mais nada naquela noite. Tomou alguns analgésicos e não conseguiu
terminar de ver o filme.
No
dia seguinte, saiu para ver a obra e se orgulhou de ver algo tão branco, tão uniforme.
Empolgou-se e, com o resto de tinta, decidiu dar mais uma demão.
Um
mês depois, numa manhã, parecia não entender, mas leu em seu muro algo como “Tá
muito branco”. Sim, de uma extremidade a outra, a bela caligrafia aparecia
pichada em seu trabalho.
Poderia
ter levado a crítica menos a sério, mas difícil encarar isso de uma forma mais
esportiva. Experiente, sabia que precisaria de tintas e decidiu mudar a cor.
Tentou esquecer o branco pichado em represália, preferiu um tom diferente,
hortelã.
E
lá se foi para a lojinha do simpático senhor, que ficou indignado com o abuso,
mas com certeza não tanto com a nova aquisição das tintas.
Raspou
e pintou em menos de 4h, experiência é tudo. E aquele muro hortelã refrescou
demais os olhos e a harmonia da vizinhança, inspirando até outros vizinhos a
fazê-lo, deixando a rua uniforme.
Semanas
depois, não fora apenas o seu muro, foram os muros de todos os vizinhos que
aderiram à nova cor. “Verde que te quero verde”. A mesma caligrafia, a mesma
pichação.
Inconformados,
foram lamentar na lojinha de tintas. Enquanto todos reclamavam colocando as
tintas, dessa vez, variadas, sobre o balcão, o velhinho teve o cuidado de
deixar a esposa fazer as anotações dos pedidos.
A
jornada noturna nunca fez tão tão bem à sua criatividade: “O caminito é aqui”.
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