Cresci
com uma mãe extremamente católica, daquelas que todos os fins de semana, senão
aos domingos, aos sábados, está na missa. Minha mãe com certeza estaria apta a
substituir o padre.
Fato
é que, numa época não muito boa ao meu irmão mais velho, minha tia, católica ao
extremo, aos moldes italianos da minha avó, havia conseguido uma moça que
incorporava um espírito de luz, em ajuda ao meu primo.
E
aqui caíram por terra oferendas, cânticos, hóstias e entrou uma mesa branca
linda. Às quartas-feiras, meu pai e o Marcelo iam até São Bernardo do Campo
para que a “Vó” pudesse amansar os caminhos do metaleiro e abrir-lhe as portas.
Confesso
que não me lembro se deu certo, mas se eu dissesse que não, estaria mentindo.
As lembranças de sucesso seriam mais claras que o inverso.
Quando
acabei o colegial, em 1990 (ops, ensino médio), meu gêmeo já tinha estagiado e já
estava num terceiro emprego. E eu, pela escolha da época, queria ser
publicitário, tinha um caminho mais estreito para passar.
Tornei-me
um mestre em preencher fichas, fazer entrevistas e esperar que o telefone
tocasse. Desde distribuidora de filmes pornôs, vendedor de planos de saúde ou
ficar trancado num banheiro feminino – isso um dia abordarei mais pra frente –
tentei de tudo.
E
ratifico, quando tudo vai mal, quando tudo pode ruir, não importa a crença que
se tenha, não importa a reza que se faça, tudo se torna válido. A Vó entraria
em meu caminho. Aos 18 anos, fomos eu, meu pai e o Marcelo ,numa quarta-feira,
pegar os conselhos de irmãos mais evoluídos.
Dando
uma cor mais intensa ao caso, sou pisciano, creio em tudo e juro de pé junto
que vi o Papai Noel no último dezembro. Daí, minha apreensão e minha ignorância
sobre o assunto acabaram me trazendo uma paúra do inferno.
Ao
chegar, me deparei com o recém-falecido Freddie Mercury, sim, era ele, meu
irmão concordaria ao ler isso aqui. Tensão. Imaginei-me naquelas cenas da
Igreja Universal, em que havia possessão etc. Ignorância.
Aliás,
devo ressaltar que, durante minhas madrugadas de insônia e vagabundagem,
assisti a um programa pela Record, e o pastor dizia”você, que está
desempregado, pegue sua carteira agora, levante-a aos céus e berre: SENHOR,
TRAGA-ME UM TRABALHO!”
Tudo
bem que peguei a carteira, mas não berraria por causa do horário e do
constrangimento. Enfim, tensão. A sessão começaria e todos aceitaram fechar os
olhos, mas eu não. Concentração nada. “Vou ficar de olhos abertos aqui, se
algum espírito aparecer, eu corro”, pensei.
Em
segundos, a moça bateu na mesa e todos da mesa iam falando “Bênção, Vó” – e aquela
voz rouca repetindo “Deus te abençoe”.
Silêncio.
Travei, mas eu vi aquela moça antes, ouvi a voz dela antes e não era a mesma.
Enfim,
naquele dia, não pude me consultar com a Vó, mas fui a um tipo de assistente
dela. Entrei, com um cagaço monstro, na salinha, sentei-me. O rapaz sorriu,
olhou para mim e disse duas coisas que nunca mais me esquecerei:
-
Fio vai trabalhar com escrita!
Profissionalmente,
tenho 6 livros didáticos publicados no mercado.
-
Fio gosta desse, né? – com a mão perto da boca, imitando o ato de comer.
Pela
minha silhueta da época, a segunda foi óbvia, mas pela primeira, somente as
luzes de algum lugar especial endossariam minhas linhas aqui... E agora também
se tornou óbvia.
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