segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

O DIA QUE COMI O LANCHE DA PROFESSORA

Toda criança tem um trauma de primeiro dia de aula. Seja com novos amigos, seja na distância da mãe, enfim, de algum lado a quebra da rotina pode causar transtornos irreversíveis.

Posso dizer que, no meu caso, não foi uma coisa nem outra. Muito menos o primeiro dia, o que vivenciei teve uma consequência mais constrangedora e traumática ao término dele.

Fevereiro de 1979. Eu e meu gêmeo estávamos com seus uniformes impecáveis, cabelos penteados e tudo pronto para começar. Lembro que havia um grupo imenso de crianças sentadas no pátio esperando pela chamada.

Assim que nossos nomes eram ditos, tínhamos de levantar e seguir para a fila de determinada professora.

Posso pontuar aqui o porquê de amar meu sobrenome. Apeguei-me tanto a ele talvez pelo descuido imperdoável que o foi destinado. Quando ouvi pela terceira vez “Adriano Paciello”, o nervosismo era tamanho que só levantei porque não haveria um outro Adriano por ali.

“Paciello, Paciello, Paciello”, repeti a mim várias vezes tentando me livrar do constrangimento ao qual me submeti.

Enfim, turmas colocadas, aulas começadas. Olhava com certa desconfiança a todos que lá estavam e temia as meninas, porque elas não faziam parte do meu mundo. Não sabia como me dirigir a elas na mesma intensidade que não desejava isso.

Às14h45, hora do recreio, a tensão daquela meia tarde me abrira o apetite. E nunca fui, digamos, uma criança mirrada. Nem com meus 3 quilos e trezentos em meu nascimento.

Levei de lanche um pão francês com hambúrguer e uma garrafa de groselha Milani, que mal deram para tapar o buraco que havia em meu estômago. E como a sobrevivência fala mais alto, fui firme e forte para a tia Vera, dizendo:

- Tia, eu estou com fome.

- Sua mãe não lhe mandou lanche?

- Mandou, mas ainda estou com fome.

Ela olhou para o próprio sanduíche de salame e me ofereceu. Mesmo não sendo do meu gosto, aprendi que o melhor tempero era a fome e devorei o lanche da professora.

E minha sentença foi decretada. Porém, se tivesse de morrer, que fosse de estômago cheio. Assim que minha mãe chegou, a tia Vera a alertou para a quantidade do lanche, que certas crianças demandavam uma quantia mais vultosa.

O olhar que minha mãe me deu me valeu todas as 4 bolachas de água e sal que levei no resto da semana. E ouso dizer que só duas seriam suficientes para o recreio de meses.

 

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