quarta-feira, 31 de julho de 2013

O EXORCISMO DO CHIMPANZÉ

Muitas vezes nem é preciso de um psicólogo para dizer que todos os problemas estão na infância. Existem problemas, traumas e momentos irreversíveis, como o que vem a seguir.

Não darei nomes, porque eles seriam desnecessários e constrangedores. O fato é que o garoto estudava pela manhã e tinha um despertador, um macaquinho, que batia os pratos na hora escolhida, presente utilíssimo da avó.

Fato também que o macaco nunca o despertou, as pilhas estavam à espera da boa vontade do pai ou da mãe.

Numa fria noite de sexta, sabe-se lá por que a boa vontade paterna apareceu, entrou no quarto dos gêmeos e se dirigiu até o criado-mudo -  que dividia as duas camas - para colocar as tão desejadas alcalinas.

Sábado. Manhã silenciosa. Apenas o vento gélido e o ranger dos galhos.
 
Quando, às 6h, o bichinho desandou a soar aqueles pratos, o coração dos meninos quase vieram à boca. Um deles desandou a berrar, enquanto o dono do despertador ficava atônito, vendo o mais velho entrar no quarto e atacar furiosamente o bicho na parede.

O silêncio tomou conta da cena. Deixaram o possuído no chão, que ainda teimava em sincronizar alguma percussão.

O chimpanzé, ou o que sobrou dele, foi para a gaveta, de onde nunca deveria ter saído. O pior é que, até hoje, ele continua lá - mãe saudosista - e sempre evito de ficar por mais de 1 minuto naquele quarto, pois nunca se sabe quando será a o dia dele, nunca se sabe quando será a hora de despertar.

 

terça-feira, 30 de julho de 2013

MEMÓRIAS DE UMA FILA

Daquelas coisas que ocorrem uma vez na vida. Ele, fanático pela banda. Ela fanática pelo vocalista da banda. Um show, talvez a única chance de vê-los no Brasil. Ele, 18 anos, ela, 19. Não se sabe falar se a empatia foi imediata. Fila para compra de ingressos é algo muito solidário. Não se tem outra alternativa senão usar do interpessoal.

Ela sorriu, talvez ele tenha sorrido também. Garoto de poucos sorrisos e muita leitura. Ela, garota de muita leitura, muitos sorrisos e poucos amigos. E nessa sintonia um olhou ao outro e assim ficaram. 

Não cabe aqui falar quem puxou papo, cabe sim realçar que a troca foi imediata. E começou com a banda, como clichê e coerência numa espera pelo show dela e descambou para política, literatura e filmes.

E olha que eram mais de duas três de espera já, para os introspectivos poder-se-ia dizer que foi recorde. A quem nunca conversa, a quem nunca interage, digamos que ambos tinham dado um passo interessantíssimo, colocado seus mundos reclusos à mostra. Porém à pessoa certa, sem medo e de modo certeiro.

Ela se queixava de como os pais não entendiam e de como o curso de sociologia poderia servir de base a tantas coisas. Ele endossou o inconformismo dela e emendou que cansou de explicar que processamento de dados seria uma porta ao futuro.

Sorriram quando descobriram que odiavam a mesma verdura e começaram a deixar de se espantar quando viram que tinham um mesmo país para fugirem em caso de fracasso no Brasil. Houve até quem disse que fugiriam juntos, houve até quem concordasse com isso.

Lógico que estavam sós, naquele mar de fanáticos pela banda inglesa talvez fossem os únicos solitários. Anoiteceu e esfriou. As bilheterias abririam apenas às 9h do dia seguinte. Ele tinha sanduíches e ela também, os mesmos pães com muçarela e mortadela, o mesmo café na garrafa térmica.

Ele com um livro de Camus, ela com um do Gabriel. Ela já tinha lido o dele, ele já tinha lido o dela. Ela trouxera uma barraca, ele apenas um cobertor. E quando a meia-noite avançava, ela o chamou para dentro, e lá ficaram a dividir pedaços de sanduíches, comparar os cafés, ler trechos dos livros.

Houve um momento de silêncio, ela o olhou profundamente, ele também. Mas nada fizeram. O sono chegou. Ele deitou, ela também. Ele a abraçou pelas costas, ela segurou sua mão pela própria cintura. Sonharam juntos. Ele estava excitado, ela mais ainda, porém se tocaram apenas em pensamento. Nada aconteceu.

No dia seguinte, compraram seus ingressos. Tão íntimos que eram, não trocaram ao menos números de telefones. Sabiam que voltariam a se encontrar. Porém isso não aconteceu. Cada qual foi ao show em um setor e em dias diferentes.

Nunca mais se viram. 15 anos se passaram. Não souberam nada mais a respeito um do outro. Até tentariam nas redes sociais, mas, pelo jeito deles, nenhum teria um perfil aberto. Mas quis as coincidências mágicas dessa vida que se reencontrassem casualmente no campus da universidade, no país para onde fugiriam em caso de fracasso. 

Cada qual com seus propósitos, cada qual com sua família, filhos e carreiras. Eles se olharam e viram que eram os mesmos de anos atrás. Não havia outra coisa a se fazer. Sorriram. Acharam um banheiro, o mais próximo, e se amaram lá mesmo. Numa fúria contida, num sonho retido, num ideal forjado. Em 20 minutos, cada qual voltava à sua realidade. 

Trocaram nada mais que beijos, carícias e tudo que se permitiram. Não trocaram uma palavra sequer, porque tudo o que havia de ser dito ficou naquela noite. As palavras naquele momento eram completamente inúteis. Daquelas coisas que ocorrem uma vez na vida.

segunda-feira, 29 de julho de 2013

QUAL É A SUA ESTAÇÃO?

O que pensar sobre uma estação de fé? O que pensar sobre algo que ainda o mundo e a vida nem me apresentaram. Observar é tentar imaginar vidas que não passam pelos meus olhos, mas são tão óbvias e comuns que perdem a graça. Óbvio, o óbvio. Esta palavra sempre me incomodou. Não sei se pelo fato de as coisas serem tão lógicas, e acho que algum lugar há uma lógica para tudo, mas sempre fui vista como a estranha.

Sempre me disseram que não seguia os padrões normais do mundo. Ora, será que Deus ao nos dar a vida de presente deu-nos também os padrões que o ser humano deve seguir?! As leis e as normas, bem como os idiomas foram criados pelo homem, e assim são subcriações divinas.

Por muito tempo pensei que eu estivesse errada, juro. Mesmo assim, não me sentia do avesso, nunca me senti do avesso. Procurei nos livros coisas que faziam as dúvidas escaparem de minhas mãos, como se o vento dissesse: Ah, deixa isso para lá, que você já resolveu.

E eis o óbvio! Porém, uma coisa que ainda não consegui entender, a vida. Muitas vezes recheadas de óbvios não me deixo completamente lógica perante ela. A vida, para mim, não se trata de um tratado, mas de uma experiência sempre me vem como uma estação de fé, algo de uma promessa. Como se Deus nos colocasse a esperança pendurada em uma vara, e o destino montasse em mim e me fizesse - com as esporas dos dias - correr sempre atrás de algo que não pudesse alcançar. A vida me vem assim. Uma estação de fé que nunca chega e sempre é vista.

É como quando estamos num barco e sempre vemos ao longe um monte e sempre este monte nunca chega, pode se mostrar em várias posições, mas nunca podemos pôr o pé nele. É por isso que ponho o meu no chão e ganho estrada agora. Será que minha mãe sentirá minha falta? Acho que não, o trânsito e o trabalho deixá-la-ão num mundinho de mais um.

Acho que vai chover mais tarde, ainda bem que não tenho medo de chuva, adoro caminhar e chutar poças pelo caminho. Para onde vou? Nem sei. Deveria ter pegado mais alguns livros. Não sei se esse tal de Dostoievski é lá entendível, talvez não o leia. Se não conseguir entender as primeiras linhas, eu paro.

Que vergonha, não conseguir entender as palavras do meu próprio idioma, isso é uma vergonha! Ora, vou entender sim, está escrito em português, não é russo, é!? Ora, se o tradutor entendeu, acho que nem é preciso saber russo para entender a língua portuguesa, vou conseguir!

Posso muito bem inventar um crime e eu mesma desvendar! Talvez seja assim que Deus deva agir, Ele cria as pessoas, sabe que vão encontrar pelo caminho, arma um destino doido para cada uma e, se no decorrer da situação, Deus for com a cara do fulano, dá um brinde de felicidade para ele”.

E ela tinha apenas 15 anos, quando pensou isso, morreria horas depois sem conhecer a própria estação de fé.

domingo, 28 de julho de 2013

DELICIOSAMENTE LENTO!

Quando a ansiedade se torna parte do masoquismo, até torcemos para que tudo corra de modo mais lento e o desfecho seja um acalento mais do que regozijador. Para mim uma das cenas mais belas que a câmera lenta já nos mostrou, o filme é OS INTOCÁVEIS, o diretor é Brian De Palma.
 

sábado, 27 de julho de 2013

BOAS LEMBRANÇAS DE QUANDO O BRASIL...

... Produzia coisas bem legais como essa. O jogo vocal e as guitarras temperavam talentos como esses caras. Se foram eles que inspiraram o KISS ou não é irrelevante. O que importa mesmo é saber que houve uma época de bandas assim por aqui!


sexta-feira, 26 de julho de 2013

PRA VOCÊ EU SEMPRE DIGO SIM!

Não se sabe ao certo quando foi a primeira vez que aceitou uma preferência dela, fato é que, a partir de então, somente prevalecia o gosto da moça. O sim dela era imbatível, o comodismo dele também. Assumiram uma espécie de cumplicidade: ela mandava, ele aceitava.

Roupas dele, coisas dele. Chegou ao ponto de amar uma camiseta, um sapato e ter de esperar para que ela opinasse para que ele pudesse levar. E aqui nunca se saberá se era por dependência ou pela paz. Ele sempre preferiu evitar confrontos. E, uma vez confrontada, como toda pessoa mimada, o choque seria iminente.

O ponto máximo foi ela ter ficado louca quando disse não ter gostado de um livro e ele sim, teimou a moça que o livro era ruim. Mas isso seria mexer demais com o brio do rapaz, que amava o autor alemão. Só ele sabe o quão duro foi reverter o bico.

Casaram à moda dela. Tudo o que cabia a ela ou não foi de gosto dela. Os móveis da casa, as cores da parede, as cortinas, quem iria visitá-los, quem não, os convidados dos dois, as roupas que ele usaria, as refeições, os filmes, peças de teatro. Não era uma missa, mas o “amém” estava lá a qualquer hora e dia.

Até mesmo as posições na cama, quem começaria, como terminaria. E o homem deixou de ser gente há meses. E, como uma bolha de ar na água, tudo uma hora se revela, e o desgaste começou a aparecer. Não brigavam porque ele não queria. Ela pedia e ele não atendia porque o combustível havia acabado.

Ela decidiu uma terapia de casal, e foram os dois. E só ela falava, só ela expunha e só ela estava certa. Até que o terapeuta pediu a opinião dele. Ele começou a falar e ela o interrompeu.

E aconteceu, de imediato, ele se virou à falante e soltou um “feche a merda da sua boca” de modo tão natural, explosivo e raivoso, que ela se calou. O terapeuta sorriu. O rapaz se levantou e a deixou ali, só. Ela se desesperou de raiva, mimo e orgulho feridos.

Foi para casa enfurecida. Determinada a colocar um ponto final naquela ousadia dele. Foi humilhada e queria uma retratação. Quando abriu furiosamente a porta do apartamento, ele estava calma e deleitosamente lendo um livro.

Ela se aproximou de modo abrupto, puxou violentamente o livro da mão dele e exigiu:

- Se for para agir assim nunca mais fale comigo!!!

E é assim que se encerra a história de hoje. O divórcio foi pedido de um modo sereno, por sms, seguindo, como sempre, os comandos dela.

quinta-feira, 25 de julho de 2013

O LOBO E O CORDEIRO

Já havia passado tudo pela lábia e lábios dele, exceto uma freira. Sem fetiche ou aposta, a simples curiosidade em saber como seria bolinar um hábito já o deixava com aquele instinto de caçador.

Fato é que não desejou isso à toa, estava encantado com a freirinha que apareceu na igreja. Não que fosse devoto, mas o motorista, a pedido do chefe, foi levar algumas roupas arrecadadas para a campanha do agasalho e empolgou-se por agasalhar alguém também.

Estava descarregando as caixas de blusas, quando a viu. Linda, olhos penetrantes e negros, que sorriam um mistério quase explícito, quase constrangedor. Jurou ter visto um olhar mais prolongado. Por via das dúvidas, decidiu virar católico.

Mesmo que precisasse andar por 30 km, o que num domingo era quase nada. Lá estava ele, religiosamente, comungando mais do que hóstias, queria comungá-la também.

Foi no segundo mês, depois de risos e alguma conversa, que, durante o passar da sacolinha das oferendas, veio a ele um bilhete ousado e definitivo: “Depois da missa, dentro do confessionário”.

Era um sonho, deflorar uma freira naquele local? Não poderia ser algo mais clássico. Empolgou-se e deixou 50 reais na sacola. Êxtase. Percebeu que ela o olhava enquanto ele lia. Percebeu uma troca de cumplicidade, seria histórico.

A missa não terminava, o homem suava por todos os lados. Ansioso, tenso, excitado. Quando acabou, as pessoas não saíam. Ficou a ver todos os estágios da via sacra e sofrendo cada parada, cada minuto. Enfim a igreja se calou. Ela apareceu da sacristia. Sorriu um sorriso lascivo e apontou para o confessionário.

Do fundo, ele tropeçou em um dos bancos, mas não caiu. Apertou os passos e se encontrou com a moça em frente da cena. Entraram atabalhoados. Seria a primeira vez de ambos e seria inesquecível.

Beijaram-se. Agarraram-se. Atracaram-se. Por segundos, ele imaginou que era algo diferente demais para uma freira, igual demais para uma mulher vivida. E pioraria, quando, ao retirar o hábito, vira os mamilos com piercings e as duas tatuagens, uma nas costelas e outra na virilha.

Jurou estar num sonho, assim que recebeu o primeiro bofetão no rosto ou o primeiro arranhão nas costas e a primeira mordida nas coxas. Quase apagou com a chave de perna e julgou-a insana ao acender as velas e tentar queimá-lo no peito.

Conseguiu  num empurrão colocá-la do outro lado, foi o tempo suficiente para pegar as roupas e sumir de lá. Tropeçou em um dos bancos, mas não caiu. Ele teve tempo ainda de se benzer, com a certeza de ter visto o próprio diabo.

E ela, mais uma vez frustrada, constatou que os católicos não eram tão católicos assim. Não conseguiu realizar sua fantasia, perdera a aposta e teria de pagar, pela terceira vez consecutiva, a rodada de chope a todas as Carmelitas.

quarta-feira, 24 de julho de 2013

FALA COMIGO!

Que trabalhar também é uma comprovação de que você conviva com seres que jamais seriam seus amigos é um fato, entretanto nunca ter trocado palavra alguma com algumas pessoas da empresa, mesmo dividindo o mesmo elevador, e a dois, já passa a ser caso crônico para um leproso.

Nem um bom-dia sequer, e olha que a moça era falante, mas respeitava o silêncio alheio. Aquele senhor carrancudo, engravatado, chefe do setor financeiro tinha lá seus traços de avô, mas a voz cega. Diziam os mais próximos que era homem de poucas palavras mesmo, que nem mesmo a secretária, próxima há mais de 10 anos conseguia arrancar pouca coisa.

Nas reuniões de diretoria, era sempre breve, falava o necessário, exemplo típico de competência com silêncio, Os 10 subordinados conseguiam arrancar um menear de cabeça no cumprimento. Da hora que entrava na sala, metia-se no trabalho. O telefone só tocava para coisa particulares. 

Porém, assim como ele, a família pouco ligava, ficando à secretária como voz dele. 

Quis o destino que o senhor fosse pontual. Às 7h30 estava no elevador, assim como a auxiliar-administrativo. Queria  destino que se falassem. Emparelhavam-se todas as manhãs, mas o bom-dia dela sempre ficava no ar. Nenhum olhar. E aqui não se sabe o que mais se perpetuava: o silêncio dele ou a insistência dela.

Curioso era o ritual entre eles, ela nunca falou dos encontros a ninguém, ele, muito menos. Todas as 7h30 de segunda a sexta eram regados ao solo e ao silêncio. Talvez fosse uma espécie de desafio entre ambos. O "eu vou insistir" contra o "jamais conseguirá".

10 meses depois, e naquela manhã ela tentou algo ousado. Quando entraram, além da saudação apareceu um "o senhor sabe quanto está o dólar?". Ele mal respirou. Parecia ter aberto a boca um pouco, mas era para espirrar. Saiu como de costume no 5° andar e ganhou um irritado "obrigada pela atenção".

Semanas depois, foi a vez de um "a poupança é um investimento seguro?". Seguiram-se outras mais tentativas, e nada.

Até que uma virose tirou-a por duas semanas do trabalho. Ficou internada, voltando à empresa sob cuidados e zelos. Uma manhã fria aquela, fazia 5 graus, e lá estavam os dois. Emparelhados. A porta do elevador se abriu, a porta fechou, ela quase como um piscar de olhos, diria um "bom dia", mas calou-se imediatamente quando escutou: "Que frio".

Ela ficou muda e muda ficou mais ainda quando ele saiu e disse um bom-dia seco, ainda que houvesse música naquilo. Ela entrou sorrindo no oitavo andar e sorriu mais ainda pela calorosa recepção que teve dos colegas de trabalho.

E seguiram e seguirão mais semanas emparelhados, ele nunca mais abriu nem abrirá a boca, ela jamais deixou  nem deixará de cumprimentá-lo. Mas ambos tiveram a certeza de uma coisa: aquela semana foi a mais fria do ano.

segunda-feira, 22 de julho de 2013

CONCURSO INDEFERIDO

11 anos lecionando em cursos preparatórios para concursos públicos foram o principal motivo que me fez assistir, depois de mais uma jornada de aulas aos concursandos, ao filme recém-lançado O CONCURSO. Confesso que num longa em que se lê Sabrina Sato no elenco não se pode criar grandes expectativas, e foi a melhor coisa que fiz.

O que poderia ser algo mais que interessante caiu num pastelão barato, em clichês previsíveis e plágios do cinema americano. O início informativo exaltando o quão difícil é conseguir a tão sonhada estabilidade foi abordada de modo cômico, e os primeiros minutos do filme prometiam alusões muito fiéis às que vivem os alunos.

Mas não, o bizarro, o surreal e o nefasto acabam tomando conta da narração e do desenrolar da trama, que traz 4 candidatos à prova final, e oral, para o cargo de juiz federal, o mais alto salário do funcionalismo. A cobrança da família, a esperança da família – tal qual vividas pela maioria dos estudantes desse segmento - foram abordadas com fidelidade.

E o que poderia ser uma espécie de alento, uma espécie de companheirismo e, por que não, um endossar a todos de que os concursandos sofrem como nunca nessa jornada, tornou-se em desfechos absurdos, irreais e frustrantes.

E a resposta do porquê tenho visto mais filmes profundos que comédias amenas ressoou forte. Se havia alguma tentativa de mudar o meu hábito de assistir a obras mais inteligentes, caiu por terra durante os quase 90 minutos de projeção.

Estaria exagerando que o filme é de todo ruim, rende boas risadas. A cobrança do pai do gaúcho Fabio Porchat, vivido pelo honesto Jackson Antunes, por exemplo é algo a ser citado. Sem contar as belas tomadas do Rio de Janeiro.

Algo a ser abordado também é a forma como um dos filhos ilustres de Piraporinha, interior de São Paulo, é enaltecido com faixas e festas por estar entre os 4 finalistas, uma alusão perfeita ao que costumo dizer em sala: a esperança da família, o orgulho da cidade, uma celebridade da estabilidade.

Fora isso, um passatempo água com açúcar que pode render algumas risadas, mas que não se sustenta pela forma irreal com a qual foi mostrada. Enfim, não condeno a sua exibição, porém O CONCURSO acabou se tornando apenas uma promessa de um longa fenomenal.

E não poderia fechar esse relato dizendo a frase sensacional que os livros preparatórios berram e a que a personagem de Sabrina Satro mais evoca no filme: “Você tem que me comer!”.  

sábado, 20 de julho de 2013

ABERRAÇÕES

E pra você, que amava Mick Jagger e David Bowie, preferiria que eles ficassem em silêncio e estáticos em algum canto escuro!


segunda-feira, 15 de julho de 2013

A DOCE BRUTALIDADE DE HANNA ARENDT

Hanna Arendt
Sei que o alemão é uma língua meio bruta, porém, de uns tempos pra cá, acabou tomando outros sons em meus ouvidos. Fato é que optei por ver HANNA ARENDT por dois motivos, primeiro, pelo tema – que já enveredaremos por ele, segundo, pelo idioma.

Talvez os anos teimem em me mostrar que tudo é uma questão de costume, por isso a brutalidade linguística do alemão começa a ganhar contornos mais interessantes a mim, endossado por este longa excelente.

De origem judia, a filósofa alemã acaba sendo rechaçada pela sociedade por entender que os crimes cometidos por alguns nazistas não passaram de uma questão hierárquica, burocrática. Enviada pelo THE NEW YORKER para cobrir o julgamento de Adolf Eichmann, sequestrado em Buenos Aires, e levado à corte em 1960 – ela constata que o comandante alemão era somente um leal servidor, não um monstro.

Daí surge o livro EINCHMANN EM JERUSALÉM. Apenas 10 páginas publicadas na revista foram suficientes para render a ela o título de “defensora de nazistas”.

Reconhecida pela sua arrogância – ou diria segurança – ela não cede às pressões de parar, mesmo sendo impedida de continuar suas aulas na New School of Social Research, onde defende sua tese de não ser uma adepta a Hitler, senão alguém que entendeu o dever de um alemão.

A professora e jornalista é aplaudida por todos – inclusive por mim, a excelente atriz alemã Barbara Sukowa é um show à parte - continua lecionando por lá até 1975, ano de sua morte.

O roteiro do filme é maravilhoso, a forma como os filósofos e estudiosos encaram o nazismo passa a ser uma aula de História e Filosofia. Mais que entender a opinião dela é entender os dois lados, e isso acaba sendo um exercício fenomenal de abstenção e imparcialidade.

A atriz Barbara Sukowa, como Hanna
Tente esse exercício e perceba a metáfora do cão latindo cada vez que a porta do apartamento dela se abre, é fantástico.

O único lado ruim do longa foi a sala onde foi projetado. Os assentos do cinema da Livraria Cultura são ótimos na disposição, mas péssimos em conforto, e eu, que fui predisposto a amar a língua alemã, tenho a certeza de que nunca amarei aquelas poltronas vermelhas.
 

domingo, 14 de julho de 2013

YOU'RE MY BEST FRIEND

Não fui a uma guerra, mas sei bem como seria comigo! Então resolvi dividir meu coração em dois, porque, se santo Agostinho disse "quem canta reza duas vezes", endosso e parafraseio, dizendo: "quem é amado por cães, é amado mil vezes!


sábado, 13 de julho de 2013

LONG LIVE ROCK'N'ROLL

Em 1982, meu irmão Marcelo apareceu com um LP dessa banda. Quando escutei, soube o que seria de minha formação e gosto musicais para o resto da minha vida.

Foi quando eu soube que todos os dias seriam 13 de julho para mim!

Feliz Dia do Rock!


quinta-feira, 11 de julho de 2013

UMA NOVA MANHÃ!

E ele estava no meio da correria. Tinha acordado atrasado. Despertara quarenta minutos mais tarde que o previsto e lutava contra a água no banho. Não se lembrou de fazer a oração de proteção, pensava apenas em encontrar a roupa certa e sair.

Mal se barbeou, enquanto escovava os dentes, tentou pentear o cabelo, mas lembrou-se de que, ao colocar a blusa, o cabelo se desmancharia. Cuspiu a água e deixou a escova cair na privada. Xingou. O dia mal tinha amanhecido e ele já estava ensandecido.

Pegou a escova, secou-a na toalha, afinal havia ninguém por ali. Ao sair, bateu o dedão do pé no batente da porta, agachou-se de dor, o que atrasaria ainda mais sua ida ao trabalho. Fazia frio, ligou o rádio e, mancando, abriu todas as portas do guarda-roupas, pois a dor e a afobação eram tamanhas que o cegavam.

12 graus, 5h30. Noite ainda. Pegaria o metrô mais cheio se demorasse. Não encontrou as calças certas logo de cara, porque pensava em qual blusa usaria. Estava de cuecas e meias. Enquanto passava o desodorante, abriu a gaveta das camisetas. Se esquentasse, teria de usar uma boa, não encontrou uma boa. 

Tinha de encontrar a blusa certa, porque usaria uma camiseta ruim. O desodorante caiu. Ele pegou rapidamente, mas bateu a mão na cama. Xingou, além de mancar, agora a mão latejava. Encontrou as calças, encontrou a blusa. Precisava do perfume. Não achou, preferiu a manteiga de cacau, com o frio e a caminhada até o metrô, os lábios rachariam. Besuntou-se.

Saiu às pressas, mal sentiu o frio e, na esquina, lembrou-se da planilha e do pen drive. Xingou de novo. Teve de voltar. Mais dez minutos de atraso por conta disso. Mancava, a mão latejava, os olhos ardiam. 5h45. Rua de novo. 

Tudo doía agora. Dedo do pé, mão, olhos, cabeça. Xingou. Passos rápidos, mas nem tanto por causa da dor. Atravessou e viu um mendigo. Havia um cão, talvez tenha sentido inveja, porque dormiam juntos. E mais inveja ainda quando o cachorro percebeu que ele cruzava o caminho de ambos.

O bicho levantou-se e latiu, protegendo o dono, que não acordou. Seguiu em frente e olhou para trás, viu o cachorro se deitar de novo. Chegou à estação. 5h59. Subiu correndo as escadas e, ofegante, estava na plataforma. De cima olhou para o lado e viu a aurora mais linda da sua vida.

Tons róseos e um azul penetrante. Não havia nuvens, apenas a promessa de um dia lindo, de um novo amanhecer e de uma nova chance de sorrir. Então, ele parou e ficou por lá. Viu um dia novo. Viu uma nova vida. 6h15. Jogou a planilha e o pen drive lá de cima. Voltou para casa, mas sem antes deixar dois pães ao mendigo e ao cachorro, que, dessa vez, não latiu, e até lambeu-lhe a mão.




quarta-feira, 10 de julho de 2013

AFLUENTES BARRENTOS

Fato, mulheres, todas elas, nascem com um sentido a mais, para compensar o sentido fisiológico a menos. Laxantes, chás, simples, se nem Deus conseguiu dar a elas o dom do dois, o homem não seria capaz disso.

Nem a TPM chega perto de uma prisão de ventre. E parece que muitas têm uma perpétua, um tormento que as acompanha desde a infância. Em vez de darem panelinhas e pequenas cozinhas às meninas, deveriam dar laxantes já e perpetuarem o pinico até à puberdade.

Talvez as dançarinas do ventre usem isso não para seduzir os homens, senão o cocô. Sim, o mundo desconhece um país do oriente médio famoso pelos purgantes. Se nosso protagonista estivesse em qualquer país de lá, não teria passado pelo que vamos ler.

Paixão avassaladora, daquelas que o fogo gela perto dela, tão avassaladora que em menos de um mês o colocava todas as noites e manhãs com ela. Primeiros dias, tudo quente, forte, perfeito, mas algo corria diferente do normal. Quando namoraram, quase um ritual o café da manhã. Eles trabalhavam próximos, entravam no mesmo horário.

Entretanto o horário dela pareceu ter mudado. Ela não mais saía junto ao marido.  Sempre uma visita ao cliente, uma reunião em outro; sinceramente algo não cheirava bem, aliás nada cheirava, nem cheiro. A desconfiança do rapaz começava a perturbar a paz dos dois. A vergonha, um único banheiro pareciam ser menores que um improvável amante.

E como início de tudo sempre existem mais concessões do que tudo, ela cedeu e passou a coincidir os horários. E tudo travava, nem control, alt del para a coisa desandar. O motivo era simples, o intestino já não lhe era lá regular e a presença do homem em sua casa fazia-a ficar mais ressequida ainda. Tudo só saía quando ele saía na frente.

Concentração demais para os caminhos fluírem, para que a natureza deixasse a gravidade chamar, e ele atravancava o caminho, obstruía o percurso. Nada. Enfezada ao extremo, mau-humor, sem sexo, sem beijos. Ela não dizia, mas 10 dias sem pintar a porcelana punha tudo quase por água abaixo. Mamão, lacto-purga, Yakult, Activia, tudo e nada. Até aparecer um chá: Plan 30. Um saquinho e batata, quer dizer, privada. Ela tomou três. E o que poderia levar umas 24 horas para fazer efeito, levou 6. 10 dias para sair em 5 minutos.

Ele tinha de ir na frente, porque o Olodum tocaria forte naquela manhã. Uma reunião? Uma visita. Cazzo, por que não a verdade: uma baita caganeira. A vergonha era maior que as cólicas e os roncos intestinais. Mais pareciam uma corrida de Stock Car a toda. E ela não queria e ele pedindo e ela peidando. Sensação maravilhosa aquela, e todos sabemos que a flatulência é a profecia do bolo fecal. E ele dizia presente com força naquela manhã. Não havia como segurar.

Existem momentos que a força cede e a natureza faz a coisa fluir. Ele abriu a porta do box e antes que pudesse falar algo, viu uma mulher contorcida, só de calcinha branca, comparada agora a um vulcão em erupção, como se as lavas que eram expelidas não tivessem destino e escorressem pelas pernas bambas da mulher. Sim, ele viu algo inédito, duplamente inédito, intimidade demais, algo constrangedor. Ele que tanto esmerou a água da ducha quente percorrendo aquela pele, via agora uma gosma e seus vários afluentes a correr pelas pernas da mulher, que, morta de dor, alívio e de vergonha, urrava:

- Suma daqui!

E que cheiro era aquele? Dizem que o beijo é o termômetro de tudo, que o sexo é a intimidade permitida, mas depois daquele dia, os lábios que já beijaram tudo por ali não seriam mais capazes de fazer o mesmo caminho que as lavas barrentas.

A intimidade extrapolou os limites que qualquer pessoa poderia ultrapassar. Agora ela precisaria de alguém inédito, porque dividir a cama com um bidê, não mais estaria nos planos dela. E nesse relacionamento a semelhança entre a rapidez e a disenteria, ambos rápidos e dando em merda.

terça-feira, 9 de julho de 2013

DASLU PAMONHA

Depois de muitos anos, e olha que vão anos aí, fui a uma quermesse no último domingo. E na Mooca, o mais paulista de todos os bairros do mundo. Mamas, tias gordas e peitudas disputavam um número do bingo, cujo primeiro prêmio seria uma batedeira linda.

Metade da rua lotada, cheiro de favo e de churrasco no ar, trazia aquela mescla de festa de vizinhos em que era uma curtição ficar até mais tarde na rua, e haveria assuntos para meio ano.

O pior é que em meio ao caos instalado tudo funcionava, a começar pela organização das fichas. Sim, você escolhia o que comeria e beberia e comprava tudo antes em dinheiro estilo “banco imobiliário”.

E o primeiro impacto, havia fila para quem fosse comprar com dinheiro e outra com cartões de débito. Tecnologia na quermesse do bairro, é como flor artificial - mas optei por ela. As filas da barraca da fogazza e a do cachorro-quente eram imensas e, em meio às nonas servindo de modo vagaroso, tudo funcionava.

O mais interessante é o olhos-nos-olhos e o sorriso fácil, deixando qualquer impaciência para trás. Endosso que a simpatia acaba sendo a melhor propaganda. E mesmo que houvesse mais pão que salsicha, ainda assim se tornou o melhor sanduíche do mundo.

Na barraca da fogazza então, a coisa era mais complicada, a fila organizada andava pouco, você chegava, a nona do caixa anotava seu pedido, sorria e as outras, lentamente, chamavam pelo número: certeiro. E o olhar estava lá, sorrindo e felizes por estarem servindo.

E quanto custaria tudo isso, e um favo no fim e mais um suco? Exatos 14 reais, menos que muita sobremesa por aí. Não foi pela quantia, poderia ser tudo uns 50 reais, fato é que me vi na década de 80, com a melhor jaqueta, o iate quadriculado e o dinheiro contado.

Deixei o local umas 23 horas, saudoso, coisa que raramente valorizo. Ao chegar no estacionamento, fiquei mais saudoso ainda – em meados de 1980, eu ia a pé à quermesse - o cara me cobrou 30 reais justamente porque disse que iria ao evento.

Cazzo, a pergunta grunhida e mal-humorada do tiozinho valia 30 reais, por uma hora e meia?!

Com isso, saí mais satisfeito ainda, porque, se cada nona me cobrasse o valor do sorriso e do olhar que me deram, seria a primeira quermesse a ser dividida em 6 vezes no cartão e em 10 no boleto bancário.

 

sexta-feira, 5 de julho de 2013

EVOLUÇÃO DA MÚSICA

O grupo é o PENTATONIX e os 4 minutos que seguem deixam qualquer um boquiaberto ao ver como o quinteto é ótimo e como a música está fadada às poucas luzes!


quarta-feira, 3 de julho de 2013

REGOZIJO

Sofria um homem solitário. Rezava para ser levado daquele mundo, tampava a luz que recebia. Rezou tanto, pediu tanto que adormeceu e se viu sentado à beira de um rio, e nele estava um homem, que olhou-o, sorriu e falou:

Não criei a solidão, apenas deixei de criar algo. E quando o veredicto de solidão é proferido, o homem condena o esforço alheio, nunca o próprio. É automático, punir-se por causa de si mesmo não está coeso ao fato da solidão, que, de tão egoísta, acaba por ser preguiçosa e covarde.

A solidão tem novos companheiros, justamente ela que nasceu para não existir, ou apenas ser um estado, acabando pondo permanência e sendo invocada nos momentos mais perigosos. E disso decorre a morte. Umas vezes  por minha  vontade, outras  pela  vontade  alheia. E eis o mistério do universo, a morte, desejada por maledicências, desejada pelos homens, mas sempre batizada por Deus. E sou assim, vida e morte, em uma fonte que somente começa.

Mas, às vezes, o cansaço me alveja, cansa-me tanta falta de fé, cansa-me tanto exagero nela. Pedi amor e mais nada, nada exijo, nada  puno.  Ora, criei o livre-arbítrio para isso, e a culpa é minha?! Minha?! Logo eu que deixo a vida aos homens e interfiro indiretamente, jogando oportunidades e mais oportunidades. De que culpa sou merecedor se as pessoas não percebem que a vida é muito mais que desejar, que os  desejos estão aí,  frente a frente com eles, e não percebem isso.

Passam o tempo lamentando o presente e esquecem que o futuro está sempre e apenas a um passo adiante, de mão estendida, à espera da mão certa, a mão que nasceu para apertar-lhe os anseios não lhe chega, mas vai ao encontro das lágrimas e do desespero. Mal sabem dos sentimentos que possuem, confundem carne e espírito, misturam com amor e acham-se injustas aos meus olhos por algo que jamais creram, não pararam para escutar o que estava errado, o que estava certo.

Confundem visões e ilusões e quando tudo os leva a crer que a felicidade está ao lado, desmerecem-na e deixam-na de lado, e eu sou o culpado. O homem é uma tentação a minha fé, uma bela tentação. Como o homem não sabendo  quase nada  de  fé pode ser, ao mesmo tempo, um antídoto contra ela?

Agora, é a morte. O que dizer sobre a morte, o que falar dela e como justificá-la aos padrões humanos algo que nasce da vida e para a vida e a favor dela retorna? Dar água a quem dela carece, dar fogo a quem dele carece. Dar vida a quem dela carece e dar morte a quem dela carece. E o que seria a vida a quem nela se inuma?  E da morte a quem nela se inclui? Dou ar a quem na vida se encontra e dou doença a quem na morte o faz. E ar e doença são os prefácios dessas distinções, como distintas são a dor e a luz, como iguais são a morte e a vida.

São almas gêmeas precisam uma da outra para existir. Como o fogo carece  da água,  como a  dor carece do  ar, como a escuridão carece da luz. E se dei o livre-arbítrio a todos, cada um tem a própria preferência. Nasceu o problema, a solução está ali. Mas a fé em mim ainda continua sendo forte. E quem tem em mim o salvador tem em si próprio a coragem de vencer.

Crê em mim que sou luz, sou homem, sou vida e morte. Sou carne e alma, pranto e sorriso, sou silêncio, grito, homem e mulher, além de ter a forma que quiser, sou crença, fé, posso ver, fazer, tudo aquilo que eu possa merecer.   Não recebo, apenas ofereço”.

E então, o solitário acordou, jurou ter sonhado algo bom, mas não se lembrou de nada, apenas sentiu coragem para olhar mais uma vez para a própria vida.

 

segunda-feira, 1 de julho de 2013

UM FRANCÊS TERRÍVEL, UM ESPANHOL PROMISSOR E O SORRISO DO EX-GOVERNADOR

A decepção, decididamente, é uma dos mais agudos sentimentos que a humanidade pode vivenciar.  É uma espécie de impacto fétido. Algo que se esvai de um modo tão inesperado, que não se consegue ao menos tentar resgatá-lo, não se consegue ao menos esboçar uma tentativa positiva de encará-lo.

Ela é a tristeza sem precedentes, é a melancolia não-avisada, é depressão no seu estágio mais suave. E aqui se encaixa qualquer situação em sua vida. Pessoas, momentos, uma festa, uma música ou um filme.

Pois é este que será o teor do texto. Sou louco por eles. Há tempos não sei o que é passar uma semana sem assistir a um lançamento ou rever outras maravilhas – uma boa forma de evitar a decepção é isso, o replay.

Pela primeira vez no CAZZO! Vou ter de propagar uma nada legal crítica a uma película francesa. Sempre digo que os trailers são uma propaganda, muitas vezes, enganosa.

Confesso que dificilmente me enganei, de súbito, apenas MAR EM FÚRIA me veio como prova de um sentimento frustrante. Até sábado último.

Quando vi as chamadas do filme francês, quando li o resumo do conteúdo dele, fui tomado de uma esperança muito forte: a de que a fantasia seria única. A proposta era interessantíssima e vinha do livro homônimo de Boris Vian.

Sabe aquela sensação de nunca ter escutado sobre o autor e, ainda mais, pela magnífica história que seria contada e você nunca soube a respeito – e até se condena por ser tão ignorante e nenhum dos bons amigos que devoram livros falar sobre? Pois é, imagine a carga de expectativa que coloquei quando vi que A ESPUMA DOS DIAS existia, mas era um prenúncio ao nada... E foi.

Estreou no último dia 28 e, duvido, duvido que tenha vida longa como os muitos a que assisti por aí. Entrei ansioso, sentei e, já com 15 minutos de filme, dei a primeira cochilada. Feio, bem feio. Foi a segunda vez que isso aconteceu comigo no cinema e, coincidentemente, com a excelente Audrey Tautou na trama.

O longa é uma mescla do surrealismo de Macunaíma, que também me provoca enjoos, com toques futurísticos e muita informação, muita informação. Cada segundo é repleto de detalhes absurdos, desnecessários, exagerados. Não me considero um profundo conhecedor da sétima arte, mas estou longe de ser um obtuso, que não entenda as metáforas e mensagens camufladas em diálogos e cenas.

A história de amor entre Collin e Chloé não convence. Tudo muito superficial, o sentimento entre eles não traz a sustentação devida. O amor acaba sendo algo tão bizarro como as cenas exageradas e sem sentido. A personagem de Audrey acaba engolindo uma flor, que a condena à morte.

E juro, nunca torci tanto para uma personagem morrer e o filme acabar.

Fujam dele.

E eu, que odiei o Gatsby, agora retifico minha crítica. Quando assisti a ele, disse que, naquele dia, o melhor foi ver que o novo do Almodóvar estrearia.

Anteontem, a sala ao lado já trazia a nova comédia do espanhol. Ratifico e repito meu comentário, o melhor da noite foi saber que a decepção com o Pedro é quase nula. E por quê?

Porque, pra fazer o ex-governador José Serra sorrir é uma tarefa de poucos e, enquanto eu esperava para entrar na sala 1, vi que o vampiro saía da 2, com um sorriso feio, como de costume, mas sincero, e isso apenas gênios como Almodóvar sabem fazer.