Com a média de gols extraordinária, mais de
100, a equipe era base da seleção do país. Orgulho da cidade, inveja dos
coirmãos. Faixas de campeão vendidas a rodo, fogos a semana inteira anunciando o
óbvio, um natal mais feliz a idosos, que relembravam os anos de glória, e a crianças,
que finalmente devolveriam tudo que vinham sofrendo.
Domingo já de férias, clima agradável,
ingressos nem com cambistas, transmissão até para a cidade onde seria a final.
O estádio quase veio abaixo quando os iminentes campeões apareceram no gramado.
Fogos, fumaça, papéis higiênicos num clima retro brindavam o título.
5 minutos, 10, quase e nada do adversário
aparecer. Ganhar o jogo por WO não seria digno para todos. Até que o massagista
dos rebaixados entra em campo e puxa o árbitro para um à parte. Por uma questão
absurda de logística e incomum, o uniforme dos jogadores tinha sido desviado
sabe-se lá pra onde.
Sim, sabe-se lá como, a bagagem com os uniformes foi extraviada e eles não tinham como entrar em campo. Caos. Discussões entre dirigentes. A notícia chegava às arquibancadas, deixando a festa com um sabor meio amargo. Depois de quase meia hora, a hecatombe foi aceita: o adversário jogaria com o conjunto do uniforme número 3 dos da casa.
O branco seria páreo contrastante ao azul.
Festa retomada e, em minutos, estavam em campo. Nada seria motivo pra se
estragar o clima. Hino Nacional em uníssono, palmas, e o apito soava como um
bálsamo, bola em jogo e, em dois minutos, já na trave dos rebaixados. Um
uníssono “uuuuuuu” foi ecoado por lá. O gol seria questão de minutos, e foi.
Num contra-ataque avassalador, a torcida mal
pôde crer, sim. Os de azul abriam o placar. Sim. Agora, para ser campeão, o time
da casa precisava fazer um gol. Perdiam. Isso não calou de vez os torcedores,
que se inflamavam e viam, de novo, outra bola na trave. O empate era iminente.
E permaneceu iminente com mais três chances claras de gol, e ficou mais
iminente quando o zagueiro tirou a bola em cima da linha, e ficou iminente até
o término da primeira etapa.
O intervalo foi um silêncio. A iminência do
gol de empate voltava junto com o canto das arquibancadas e o time da casa, com
mais um atacante. E o gol de empate ficou iminente naquele contra-ataque em que
o goleiro fez um milagre. E mais iminente ainda quando a quarta bola na trave
ressoou por ali.
Mas não tão iminente, quando o centroavante
avançou livre, e o lateral, num carrinho por trás, fez pênalti e acabou
expulso. O estádio veio abaixo. Fogos, cantos e aquele terremoto branco
presente. O meia, artilheiro do campeonato, cobrador oficial, pegou a bola.
Silêncio. O time da casa, com um a mais, ratificaria o título iminente.
Escolheu o canto e bateu. O grito de gol desceu goela abaixo, porque a bola,
pela quinta vez, explodiu na trave. A partir de então, foi um festival de
desespero e chuveirinho na área. Com 10, os rebaixados se fecharam, e o
iminente campeonato começou a sair do estádio aos poucos, sem que ninguém
percebesse. Nem mesmo os 5 minutos de acréscimos ajudaram.
Fim de jogo. Rival campeão em outra cidade,
festa adiada, numa tarde inesquecível, que endossou, literalmente, a explicação
do capitão derrotado: “perdemos para nós mesmos”. E ninguém do time adversário
quis devolver a camisa azul.
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