terça-feira, 6 de janeiro de 2015

LISTA DE PROMESSAS

Poderia entrar no clichê das promessas e da lista de início de ano, entretanto preferiu não cair nas armadilhas da vida, já que se trancou nas próprias arapucas e de lá teve de sair quando ninguém mais estava vendo. 

Sabia que a própria consciência sim, e dela não conseguiria fugir. Decidiu então prometer o que tinha certeza de que faria, só para ter certeza se o papel realmente remaria contra os próprios interesses.

Fumaria até tossir sangue. Comeria até verter entranhas. Beberia até vomitar a vida. Apaixonar-se-ia pelas pessoas erradas até o coração evaporar. E, pela primeira vez, seguiu à risca. 

A pessoa tinha o aroma de uma nota desafinada e exalava desilusão. Foi colocada para dentro de sua vida de modo rápido, sem pestanejar. Foram dois dias de loucura até descobrir que ela era casada, com dois filhos e um golden retriever. 

E o coração evaporou-se. 

Mesmo que precisasse do trabalho, não parou para contar as coações, as humilhações pelas quais andava diariamente. O aluguel não poderia atrasar. Não contou as horas que passou em silêncio com um lanche e as planilhas sempre erradas. Seria uma insanidade precisar o vaivém frenético dos prazos não cumpridos e nada compridos. Acabou perdendo o emprego.

Engoliu sapos até verter as entranhas.

A procura por uma recolocação aos 34 não era algo fácil. Foram incontáveis os currículos, as entrevistas e as promessas. Chegou próximo de um sonho, que esbarrou no espanhol largado no segundo módulo. Entrou em casa e percebeu que não teria o dinheiro do aluguel daquele mês. 

Bebeu até vomitar a própria vida.

Lembrou-se da mãe, que disse ser ajuda a tudo que pedisse. Correu até ela, chorando, e abriu o pulmão e a alma de uma vez só. Estava só, sem dinheiro nem sonhos. Teve  de escutar a comparação com os primos e os vizinhos cujas histórias de sucesso se esfumaçavam em sua frente.

E as fumou até tossir sangue. 

Sentiu-se o ser mais solitário do mundo, chegou a sentir ao mesmo tempo dó e orgulho de si. Soube que era capaz de seguir à risca tudo o que desejou fazer e percebeu que tinha um talento imenso à autossabotagem. E fez a única coisa que lhe cabia, abandonar-se. Quando as bagagens são grandes, algumas devem se perder pelo caminho. Largou-se como se larga um saco de arroz numa carga, que foi levada pra longe.

Chovia muito no dia seguinte, mas os pingos só acertaram as suas pegadas, dessa vez venceu e talvez a sorte começasse a mudar...


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